sexta-feira, 4 de julho de 2025

Hannah Arendt - Origens do Totalitarismo: Parte I Antissemitismo (3. Os Judeus e a Sociedade: 3.4.1)

Origens do Totalitarismo

Hannah Arendt

Parte I 
ANTISSEMITISMO

Este é um século extraordinário, que começa com a Revolução e termina com o Caso Dreyfus. Talvez ele venha a ser conhecido como o século da escória. 
 Roger Martin du Gard

3.  Os Judeus e a Sociedade
     3.4 - O caso Dreyfus
          3.4.1 - Os fatos
     Aconteceu na França no fim de 1894. Alfred Dreyfus, um oficial judeu do Estado-Maior francês, foi acusado e condenado por espionagem em favor da Alemanha. O veredicto — deportação perpétua para a Ilha do Diabo — foi unânime. O julgamento foi realizado a portas fechadas. De todo o volumoso dossiê da acusação, só foi exibido o chamado bordereau.
     Tratava-se de uma carta, supostamente escrita por Dreyfus, endereçada ao adido militar alemão, Schwartzkoppen. Em julho de 1895, o coronel Picquard tornou-se chefe da Seção de Estatística do Estado-Maior, na realidade encarregada de informações e contraespionagem. Em maio de 1896, disse ao chefe do Estado-Maior, Bois-deffre, que estava convencido da inocência de Dreyfus e da culpabilidade de um outro oficial, major Walsin-Esterhazy. Seis meses mais tarde, Picquard foi removido para um perigoso posto na Tunísia. Ao mesmo tempo, Bernard Lazare, a pedido dos irmãos de Dreyfus, publicava o primeiro panfleto sobre o Processo: Une erreur judiciaire: Ia vérité sur Vaffaire Dreyfus.
      Em junho de 1897, Picquard informou Scheurer Kestner, vice-presidente do Senado, sobre o julgamento e a inocência de Dreyfus. Em novembro de 1897, Clemenceau iniciou a sua luta para reexaminar o caso. Quatro semanas mais tarde, Zola aderiu aos partidários de Dreyfus. J'accuse foi publicado pelo jornal de Clemenceau em janeiro de 1898. Ao mesmo tempo, Picquard era preso. Zola, levado em fevereiro a julgamento por calúnia contra o Exército, foi condenado tanto pelo tribunal comum como pelo Tribunal de Apelação.
      Em agosto de 1898, Walsin-Esterhazy foi reformado por crime de peculato. Imediatamente, contou a um jornalista inglês que ele — e não Dreyfus! — era o autor do bordereau, tendo forjado a letra de Dreyfus por ordem do coronel Sandherr, seu superior e antigo chefe da Seção de Estatística. Alguns dias mais tarde, o tenente-coronel Henry, outro membro do mesmo departamento, foi preso por ter forjado várias peças do dossiê secreto de acusação; ele se suicidou na prisão. Em seguida, o Tribunal de Apelação ordenou uma nova investigação do processo Dreyfus.
     Em junho de 1899, o Tribunal de Apelação anulou a sentença de 1894 contra Dreyfus. Um novo processo foi realizado em Rennes em agosto. A 9 de setembro, a sentença foi mudada para dez anos de prisão, devido a "circunstâncias atenuantes". Dez dias mais tarde, Dreyfus foi indultado pelo presidente da República. A Exposição Mundial foi inaugurada em Paris em abril de 1900. Em maio, quando estava garantido o sucesso da Exposição, a Câmara de Deputados, por maioria absoluta, votou contra qualquer nova revisão do processo Dreyfus. Em dezembro do mesmo ano, todos os julgamentos ligados ao caso foram encerrados por anistia geral.
     Em 1903, Dreyfus solicitou nova revisão. Sua petição foi ignorada até 1906, quando Clemenceau galgou o posto de primeiro-ministro. Em julho de 1906, o Tribunal de Apelação anulou a sentença de Rennes e absolveu Dreyfus de todas as acusações, embora, segundo as leis da França, não tivesse autoridade para absolver: só poderia ter ordenado novo julgamento. Nova revisão ante uma corte militar, porém, teria, provavelmente e a despeito de todas as provas esmagadoras a favor de Dreyfus, levado a nova condenação. Portanto, Dreyfus nunca foi absolvido de acordo com a lei, e o processo Dreyfus nunca foi realmente encerrado. [l]
     A reintegração do acusado nunca foi reconhecida pelo povo francês, e as paixões originalmente suscitadas nunca se acalmaram inteiramente. Ainda por volta de 1908, nove anos após o perdão e dois anos depois de ter sido inocentado, quando, a pedido de Clemenceau, o corpo de Emile Zola foi transferido para o Panteão, Alfred Dreyfus foi atacado na rua. Um tribunal de Paris absolveu o agressor, afirmando discordar da decisão que havia inocentado Dreyfus. Mais estranho ainda é o fato de que nem a Primeira nem a Segunda Guerra Mundial fizeram esquecer o processo.
     Por iniciativa da Action Fran-çaise, o Précis de VAffaire Dreyfus [2] foi reeditado em 1924 e tornou-se, de lá para cá, o manual de referência oficial dos adversários de Dreyfus. Na estréia de VAffaire Dreyfus (peça teatral escrita por Rehfisch e Wilhelm Herzog sob o pseudônimo de René Kestner), em 1931, reinava ainda a atmosfera dos anos 90 com discussões na plateia, bombas asfixiantes nas primeiras filas, tropas de choque da Action Française colocadas nos arredores para aterrorizar atores, plateia e curiosos. Aliás, o governo — de Lavai — não agiu diferentemente dos seus predecessores de trinta anos antes: confessou de bom grado que não podia garantir uma única representação sem tumulto, oferecendo assim mais um triunfo tardio aos adversários de Dreyfus.
     A peça teve de ser suspensa.
     Quando Dreyfus morreu, em 1935, a imprensa, por medo, não comentou a questão. [3] Só os jornais da esquerda retomaram os velhos termos para se referir à inocência de Dreyfus, enquanto os da direita voltaram à culpabilidade de Dreyfus. Ainda hoje, embora em menor escala, o Caso Dreyfus divide a política francesa. Quando Pétain foi condenado, o influente jornal de província, Voix du Nord (de Lille), comparou o processo Pétain ao de Dreyfus e afirmou que "o país permanece dividido como estava após o processo Dreyfus", porque o veredicto da corte não podia solucionar um conflito político e "trazer para todos os franceses a paz de espírito ou de coração". [4]
     Enquanto o Caso Dreyfus em seu amplo aspecto político pertenceu ao século XX, o processo Dreyfus e os vários julgamentos do capitão judeu Alfred Dreyfus são bem típicos do século XIX, quando se seguiam com tanto interesse os processos legais, porque cada instância tentava testar a maior conquista do século, que era a completa imparcialidade da justiça. É peculiar daquele período que um erro judicial pudesse despertar tais paixões políticas e inspirar uma sucessão tão infindável de julgamentos e revisões, para não mencionar os duelos e as lutas corporais. A doutrina da igualdade perante a lei estava ainda tão firmemente implantada na consciência do mundo civilizado que um único erro da justiça era capaz de provocar a indignação pública, de Moscou a Nova York. Ninguém, exceto na própria França, era suficientemente "moderno" para associar o assunto a questões políticas. [5] O mal causado a um único oficial judeu na França pôde provocar no resto do mundo reações mais veementes e mais unidas do que todas as perseguições a judeus alemães uma geração depois. Até a Rússia czarista pôde acusar a França de barbárie, enquanto na Alemanha os membros da entourage do Kaiser expressavam abertamente sua indignação. [6]
     As dramatis personal do processo pareciam ter saído das páginas de Balzac: de um lado, os generais classistas procurando freneticamente acobertar os membros do seu próprio grupo e, de outro, o antagonista deles, Picquard, com sua honestidade calma, clarividente e levemente irônica. Ao lado deles a multidão indefinida dos homens do Parlamento, cada qual apavorado com o que o vizinho podia saber; o presidente da República, notório patrono dos bordéis de Paris, e os juízes encarregados do processo, que viviam unicamente em função da ascensão social. Depois, há o próprio Dreyfus, na verdade um arrivista, que se gabava junto aos seus amigos que altas somas da fortuna da família ele gastava com as mulheres; os seus irmãos, pateticamente oferecendo de início toda a sua riqueza, e depois reduzindo a oferta a 150 mil francos, para a soltura do parente, sem nunca revelarem ao certo se desejavam fazer um sacrifício ou simplesmente subornar o Estado-Maior; e o advogado Démange, realmente convencido da inocência do cliente, mas baseando a defesa em itens secundários para livrar-se de ataques e danos aos seus interesses pessoais. Por último, há o aventureiro Esterhazy, de antiga linhagem, tão completamente entediado por esse mundo burguês, que buscava alívio tanto no heroísmo como na velhacaria. Ex-segundo-tenente da Legião Estrangeira, impressionava seus colegas pelo arrojo altaneiro e pela imprudência. Sempre em dificuldades, vivia servindo de segundo aos oficiais judeus em duelos e chantageando seus ricos correligionários. Chegava mesmo a lançar mão dos bons ofícios do próprio rabino-mor para obter as necessárias apresentações. Mesmo em sua queda final, permaneceu fiel à tradição de Balzac. O que o levou à ruína não foi a traição nem o sonho ardente de uma grande orgia em que 100 mil ulanos prussos, embriagados, cavalgariam furiosos através de Paris, [7] mas sim o reles desfalque do dinheiro de um parente. E que falar de Zola, com seu apaixonado fervor moral, sua atitude patética um tanto fútil, e a sua declaração melodramática, à véspera da fuga para Londres, em que diz ter escutado a voz de Dreyfus implorando-lhe esse sacrifício? [8]
     Tudo isso pertence tipicamente ao século XIX e, por si mesmo, jamais teria sobrevivido a duas guerras mundiais. O entusiasmo que o povo tinha por Esterhazy nos velhos tempos, tal como seu ódio por Zola, já virou cinzas há muito, mas o mesmo aconteceu com aquela ardente paixão antiaristocrática e anticlerical de Jaurès que — só ela — assegurou a libertação final de Dreyfus. Como o caso Cagoulard iria mostrar, os oficiais do Estado-Maior já não precisavam temer a ira do povo quando maquinavam seus planos para levar adiante um golpe de Estado. Desde a separação entre o Estado e a Igreja, a França, embora certamente não fosse mais clericalista, havia perdido grande parte de seu sentimento anticlerical, tal como a Igreja Católica havia perdido muito de sua aspiração política. A tentativa de Pétain de transformar a república num Estado católico foi bloqueada pela completa indiferença do povo e pela hostilidade do baixo clero ao fascismo clerical.
     O Caso Dreyfus, em suas implicações políticas, pôde sobreviver porque dois de seus elementos cresceram em importância no decorrer do século XX. O primeiro foi o ódio aos judeus; o segundo, a desconfiança geral para com a república, o Parlamento e a máquina do Estado. A maior parte do público podia ainda continuar a conceber, certa ou erradamente, que esta última estivesse sob a influência dos judeus e do poderio dos bancos. Ainda em nossos dias, o termo antidreyfusard pode definir na França, de modo aceitável, tudo o que é anti-republicano, antidemocrático e antissemita. Há alguns anos, ele compreendia ainda o monarquismo da Action Française, o "bolchevismo nacional" de Doriot e o "fascismo social" de Déat. Não foi, porém, a esses grupos fascistas, numericamente insignificantes, que a Terceira República deveu o seu colapso. Pelo contrário, a verdade simples, embora paradoxal, é que a influência desses grupos antirrepublicanos nunca foi tão insignificante quanto no momento em que o colapso da república realmente ocorreu. O que provocou a queda da França foi o fato de que ela não tinha mais nenhum verdadeiro partidário de Dreyfus, ninguém que acreditasse que a democracia e a liberdade, a igualdade e a justiça ainda pudessem ser defendidas ou realizadas sob a república. [9] A república caiu, finalmente, como um fruto meio podre no colo daquele velho grupo antidreyfusard [10] que sempre constituíra o âmago do seu Exército, e isso numa época em que ela tinha — é verdade — poucos inimigos, mas quase nenhum amigo. Até o grupo de Pétain era em grau muito reduzido produto do fascismo alemão, como claramente demonstrou a sua obstinada adesão às velhas fórmulas políticas de quarenta anos antes.
     Enquanto a Alemanha nazista sagazmente mutilava a França e arruinava toda a sua economia através da linha de demarcação imposta pelo armistício, os líderes da França em Vichy entretinham-se com a velha fórmula das "províncias autônomas" de Barres, paralisando-a ainda mais. Introduziram leis antiju-daicas mais prontamente que qualquer Quisling, gabando-se por não precisarem importar o antissemitismo da Alemanha e de que suas leis sobre os judeus diferiam em pontos essenciais das do Reich. [11] Procuraram mobilizar o clero católico contra os judeus, mas só conseguiram provar que os sacerdotes não apenas perderam suas influências políticas, como também não eram verdadeiramente antissemitas. Pelo contrário, bispos e sínodos, que o governo de Vichy queria mais uma vez transformar em força política, protestaram mais enfaticamente contra a perseguição dos judeus do que qualquer outro grupo na França.
     Não é o processo Dreyfus com seus julgamentos, mas o Caso Dreyfus em suas implicações, que traça a antevisão do século XX. Como disse Bernanos em 1931,12 "o Caso Dreyfus já pertence àquela era trágica que certamente não terminou com a última guerra. O processo revela o mesmo caráter desumano, conservando, em meio ao tumulto de paixões desenfreadas e chamas de ódio, um coração inconcebivelmente frio e empedernido". Não foi certamente na França que ocorreu a sequela exata do processo, mas, ao reler a história do caso, não é difícil de encontrar o motivo pelo qual a França foi uma presa tão fácil do nazismo. A propaganda de Hitler falava uma língua havia muito conhecida e jamais inteiramente esquecida. Se o "cesarismo"[13] da Action Française e o nacionalismo niilista de Barres e Maurras nunca vingaram em sua forma original, isso se deve a uma variedade de causas, todas elas negativas. Careciam de visão social e não sabiam traduzir em termos populares aquelas fantasma-gorias mentais que o seu desdém pelo intelecto havia engendrado.
     Tratamos aqui essencialmente do significado político do Caso Dreyfus e não dos aspectos legais do processo. Percebem-se nele nitidamente vários traços característicos do século XX. Tênues e mal discerníveis durante as primeiras décadas do século, vieram finalmente à plena luz do dia, e vê-se hoje que pertencem às tendências principais dos tempos modernos. Após trinta anos de uma forma benigna e puramente social de discriminação antijudaica, era um pouco difícil lembrar que o grito "Morte aos judeus!" já havia ecoado uma vez de ponta a ponta de um Estado moderno, quando sua política doméstica se cristalizou ao redor da questão do antissemitismo. Durante trinta anos, quando as velhas lendas de conspiração mundial constituíam apenas o ganha-pão dos pasquins e da subliteratura, o mundo não se lembrava mais que, havia pouco tempo, na época em que os "Protocolos dos sábios do Sião" ainda eram desconhecidos, toda uma nação culta quebrava a cabeça, querendo descobrir quem tinha nas mãos as rédeas da política mundial: se "Roma Secreta" ou o "Reino Secreto de Judá''.[14]
     Ao mesmo tempo, a filosofia veemente e niilista da auto aversão espiritual [15] sofreu certo eclipse, quando um mundo temporariamente em paz consigo mesmo não produziu uma safra de criminosos eminentes que justificasse a exaltação da brutalidade e da falta de escrúpulos. Os Jules Guérin tiveram de esperar quase quarenta anos, antes que a atmosfera estivesse novamente pronta para a ação de tropas de choque. Os declassés, produzidos pela economia do século XIX, tiveram de crescer numericamente até que formassem sólidas minorias nas nações, antes que aquele golpe de Estado, que não passara de uma conjura grotesca [1]6 na França, pudesse, quase sem esforço, tornar-se realidade na Alemanha. O prelúdio ao nazismo abrangeu todo o palco europeu. O processo Dreyfus, portanto, é mais do que um "crime" [17] bizarro e mal resolvido, um caso de oficiais de Estado-Maior disfarçados, com barbas postiças e óculos escuros, espalhando suas estúpidas falsificações à noite, nas ruas de Paris. Seu herói não é Dreyfus, mas sim Clemenceau, e o caso começa não com a prisão de um oficial judeu do Estado-Maior, mas com o escândalo do Panamá.

Parte I Antissemitismo (3. Os Judeus e a Sociedade: 3.4.1)
_____________

[1] A obra até hoje indispensável sobre o assunto é a de Joseph Reinach, Histoire de l 'Affaire Dreyfus, Paris, 1903-11, 7 vols. Dentre os estudos recentes, o mais detalhado, escrito de um ponto de vista socialista, é de autoria de Wilhelm Herzog, Der Kampf einer Republik [Luta de uma república], Zurique, 1933. Suas completas tábuas cronológicas são muito valiosas. A melhor apreciação política e histórica do processo é encontrada em D. W. Brogan, The development of modem Fran-ce, 1940, livros VI e VII. Breve e fidedigno é G. Charensol, VAffaire Dreyfus et Ia Troisième Republique, 1930. 
[2] Escrito por dois oficiais e publicado sob o pseudônimo de Henri Dutrait-Crozon.
[3] O Action Française (19 de julho de 1935) louvou o autocontrole da imprensa francesa, enquanto expressava a opinião de que "os famosos campeões da justiça e da verdade de quarenta anos atrás não deixaram discípulos". [Action Française era o principal órgão de imprensa do mais ativo agrupamento francês, do mesmo nome. (N. E.)]
[4] Ver G. H. Archambault no New York Times, 18 de agosto de 1945, p. 5.
[5] Discutiremos adiante as únicas exceções, que foram os jornais católicos, a maioria dos quais promovia agitação contra Dreyfus em todos os países. A opinião pública norte-americana chegou a tal exacerbação que, além dos protestos, foi iniciado um boicote organizado contra a Exposição Mundial de Paris, a inaugurar-se em 1900. Essa ameaça teve o efeito que comentaremos a seguir. Para uma análise da situação, ver a tese de doutorado de Rose A. Halperin, "The American reaction to the Dreyfus Case", 1941, arquivada na Universidade Columbia. A autora deseja agradecer ao professor Saio W. Baron pela gentileza de colocar esse estudo à sua disposição.
[6] Assim, por exemplo, H. B. von Buelow, o chargé-d'affaires alemão em Paris, escreveu para o chanceler do Reich, Hohenlohe, que o veredicto de Rennes era uma "mistura de vulgaridade e covardia, que são os sinais mais evidentes do barbarismo", e que a França "com isso rompeu com a família de nações civilizadas" (citado por Herzog, op. cit., com data de 12 de setembro de 1899). Na opinião de von Buelow, o Affaire era a "senha" do liberalismo alemão; ver suas Denkwürdigkeiten [Memórias], Berlim, 1930 1,1, p. 438.
[7] Théodore Reinach, Histoiresommaire de VAffaire Dreyfus, Paris, 1924, p. 96.
[8] Relatado por Joseph Reinach, através de citação de Herzog, op. cit., com data de 18 de junho de 1898.
[9] Que nem mesmo Clemenceau acreditava mais nisso no fim da vida é demonstrado claramente pelo comentário citado por René Benjamin em seu livro, Clemenceau dans Ia retraite, Paris, 1930, p. 249: "Esperança? Impossível! Como posso continuar esperando quando já não creio naquilo que me inspirou, ou seja, na democracia?"
[10] O general Weygand, membro da Action Française, foi em sua juventude um adversário de Dreyfus. Foi um dos subscritores do "Memorial Henry", criado pelo Libre Parole em homenagem ao infeliz coronel Henry, que pagou com o suicídio suas falsificações no Estado-Maior. A lista dos que assinaram o Memorial foi mais tarde publicada por Quillard, um dos editores de VAurore (o jornal de Clemenceau), sob o título Le Monument Henry, Paris, 1899. Quanto a Pétain, fez parte do Estado-Maior do governo militar de Paris de 1895 a 1899, época em que ninguém teria sido admitido se não fosse comprovadamente um inimigo de Dreyfus. Ver J. M. Bourget, "La legende du marechal Pétain", em Revue de Paris, II, 1931, pp. 57-69. D. W. Brogan, op. cit., p. 382, observa com propriedade que dos cinco marechais da Primeira Guerra Mundial, quatro (Foch, Pétain, Lyautey e Fayolle) eram maus republicanos, enquanto o quinto, Joffre, tinha inclinações clericais bem conhecidas.
[11] O mito, que enganou quase todos os judeus da França, de que a legislação antijudaica de Pétain lhe foi imposta pelo Reich foi desmascarado pelos próprios franceses. Ver especialmente Yves Simon, La Grande Crise de La Republique Française: observations sur lapolitique des Fran-çais de l918 a 1938, Montreal, 1941, e Robert O. Paxton, Vichy France, Knopf, Nova York, 1972.
[12] Georges Bernanos, La grande peur des bien-pensants, Edouard Drumont, Paris, 1931, p. 262.
[13] Waldemar Gurian, Der integrale Nationalismus in Frankreich: Charles Maurras und die Action Française, Frankfurt-am Main, 1931, p. 92, faz uma nítida distinção entre o movimento monarquista e outras tendências reacionárias. O mesmo autor discute o processo Dreyfus em Die politischen undsozialen Ideen des franzòsischen Katholizismus. Gladbach, 1929.
[14] Sobre a criação desses mitos de ambos os lados, ver o estudo de Daniel Halévy, "Apo-logie pour notre passe", em Cahiers de Ia Quinzaine, série XL, n? 10, 1910.
[15]  A Carta à França, escrita por Zola em 1898, soa perfeitamente moderna: "Ouvimos dizer por toda parte que o conceito de liberdade foi à falência. Quando surgiu o processo Dreyfus, esse ódio crescente à liberdade encontrou uma oportunidade extraordinária, e as paixões começaram a se inflamar mesmo entre os inconscientes. Não veem que o único motivo pelo qual Scheurer-Kestner tem sido atacado com tanta fúria é que ele pertence a uma geração que acreditava na liberdade e trabalhava por ela? Hoje não se dá importância a essas coisas" (Herzog, op. cit., datado de 6 de janeiro de 1898).
[16] A natureza farsante das várias tentativas de coup d'état feitas nos anos 90 na França foi claramente analisada por Rosa Luxemburg em seu artigo "Die sozialistische Krise in Frankreich" [A crise socialista na França], em Die Neue Zeit, vol. 1,1901.
[17] Não se sabe se o coronel Henry forjou o bordereau por ordens do chefe do Estado-Maior ou por iniciativa própria. Do mesmo modo, a tentativa de assassinato contra Labori, advogado de Dreyfus no tribunal de Rennes, nunca foi devidamente esclarecida. Cf. Emile Zola, Correspon-dance: lettres à Maitre Labori, Paris, 1929, p. 32, nota 1.

Nenhum comentário:

Postar um comentário