Hannah Arendt
Parte I
ANTISSEMITISMO
Este é um século extraordinário, que começa com a Revolução e termina com o Caso Dreyfus. Talvez ele venha a ser conhecido como o século da escória.
Roger Martin du Gard
3.4 - O caso Dreyfus
3.4.4 - O Povo e a Ralé
Se o erro comum dos nossos tempos é imaginar que a propaganda pode conseguir tudo e que um
homem pode ser persuadido a fazer qualquer coisa, contanto que a persuasão seja
suficientemente forte e atraente, era crença comum naquela época que a "voz do povo era a voz
de Deus", e que a tarefa de um líder era, como disse Clemenceau com tanto desdém,[60] seguir
essa voz com esperteza. As duas atitudes derivam do mesmo erro fundamental de considerar-se
a ralé idêntica do povo, e não uma caricatura dele.
A ralé é fundamentalmente um grupo no qual são representados resíduos de todas as classes. É isso que torna tão fácil confundir a ralé com o povo, o qual também compreende todas as
camadas sociais. Enquanto o povo, em todas as grandes revoluções, luta por um sistema
realmente representativo, a ralé brada sempre pelo "homem forte", pelo "grande líder". Porque a
ralé odeia a sociedade da qual é excluída, e odeia o Parlamento onde não é representada. Os
plebiscitos, portanto, com os quais os líderes modernos da ralé têm obtido resultados tão
excelentes, correspondem à tática de políticos que se estribam na ralé. Um dos mais inteligentes
líderes dos adversários de Dreyfus, Déroulède, clamava por uma "República através do
plebiscito".
A alta sociedade e os políticos da Terceira República haviam apresentado à ralé francesa uma
série de escândalos e fraudes públicas. Invadia-os agora um tenro sentimento de familiaridade
paterna por seu rebento, um sentimento misto de admiração e medo. O menos que a sociedade
podia fazer por sua filha era protegê-la com palavras. Enquanto a ralé tomava de assalto as lojas
dos judeus e os agredia na rua, a linguagem da alta sociedade fazia com que a violência, intensa
e verdadeira, parecesse inócua brincadeira de criança.[61] O mais importante dos documentos contemporâneos a esse respeito é o "Memorial Henry" e as várias
soluções que propunha para a questão judaica: os judeus deviam ser despedaçados como
Marsias na lenda grega; Reinach devia ser jogado vivo num caldeirão de água fervente; os
judeus deviam ser cozidos em óleo ou furados com agulhas até morrerem; deviam ser
"circuncidados até o pescoço". Um grupo de oficiais revelou-se muito impaciente de
experimentar um novo tipo de canhão nos 100 mil judeus do país. Entre os subscritores havia
mais de mil oficiais, inclusive quatro generais da ativa e o ministro da Guerra, Mercier. O
número relativamente alto de intelectuais" e até de judeus que constavam da üsta é
surpreendente. As classes superiores sabiam que a ralé era a carne da sua própria carne, e o
sangue do seu próprio sangue. Até um historiador judeu da época, embora houvesse visto com
os próprios olhos que os judeus não têm nenhuma segurança quando a ralé impera nas ruas,
falou com secreta admiração do "grande movimento coletivo".[63] Isso mostra apenas quão
profundas eram as raízes dos judeus numa sociedade que estava procurando eliminá-los.
Ao descrever — referindo-se ao Caso Dreyfus — o antissemitismo como um importante
conceito político, Bernano? está com a razão no tocante à ralé. Havia sido experimentada
anteriormente em Berlim e em Viena, por Ahlwardt e Stoecker, por Schoenerer e Lueger, mas
em lugar nenhum sua eficácia foi demonstrada mais claramente do que na França. Não pode
haver dúvida de que, aos olhos da ralé, os judeus passaram a representar tudo o que era
detestável. Se odiavam a sociedade, podiam denunciar o modo como os judeus eram tolerados
nela; e, se odiavam o governo, podiam denunciar como os judeus haviam sido protegidos pelo
Estado, ou se confundiam com ele. Embora seja um erro presumir que a ralé caça apenas a
judeus, estes estão certamente em primeiro lugar entre as suas vítimas favoritas.
judeus, estes estão certamente em primeiro lugar entre as suas vítimas favoritas.
Excluída, como é, da sociedade e da representação política, a ralé recorre necessariamente a
ação extraparlamentar. Além disso, sente a inclinação de procurar as verdadeiras forças da vida
política naqueles movimentos e influências que os olhos não veem e que atuam por trás das
cortinas. Não resta dúvida de que, durante o século XIX, o povo judeu incidiu nessa categoria,
exatamente como os maçons e os jesuítas.[64] É falso que qualquer um desses grupos realmente
constituísse uma sociedade secreta propensa a dominar o mundo por meio de uma gigantesca
conspiração. Contudo, é verdade que sua influência, por mais abstrata que fosse, era exercida além da esfera formal da política, e operava em grande
escala nos corredores, nos bastidores e no confessionário. Desde a Revolução Francesa, esses
três grupos têm dividido a honra duvidosa de serem, aos olhos da ralé europeia, o pivô da
política mundial. Durante a crise Dreyfus, cada um deles pôde explorar essa noção popular,
jogando sobre o outro a acusação de conspirar pelo domínio do mundo. O termo "Judá Secreta"
é devido, sem dúvida, à inventividade de certos jesuítas que decidiram ver no primeiro
Congresso Sionista (1897) o núcleo de uma conspiração mundial judaica.[65] Do mesmo modo, o
conceito de "Roma Secreta" se deve a maçons anticlericais e, talvez, também a calúnias
indiscriminadas e impensadas de alguns judeus.
A volubilidade da ralé é proverbial, como os oponentes de Dreyfus iriam aprender amargamente
quando, em 1899, tendo mudado os ventos, o pequeno grupo de verdadeiros republicanos,
chefiados por Clemenceau, compreendeu de repente, um tanto confuso, que parte da ralé havia
aderido a ele.[66] Para alguns observadores, os dois partidos da grande controvérsia pareciam
agora "dois bandos rivais de charlatães disputando o reconhecimento da ralé".[67] Assim, o
erudito Emile Duclaux pôde escrever: "Neste drama representado diante de todo um povo, e tão
explorado pela imprensa que todo o país terminou por nele participar, vemos o coro e o anticoro
da antiga tragédia, bradando um contra o outro. A cena é a França e o teatro é o mundo".
Chefiado pelos jesuítas e ajudado pela ralé, o Exército finalmente entrou na briga, certo da
vitória. O contra-ataque do poder civil havia sido eficazmente anulado. A imprensa antissemita
havia fechado a boca de todos ao publicar a lista Reinach dos deputados envolvidos no
escândalo do Panamá.[68] Tudo sugeria um triunfo fácil. A sociedade e os políticos da Terceira
República, seus escândalos e aventuras, haviam criado uma nova classe de déclassés; não se
podia esperar que lutassem contra a própria progênie; pelo contrário, iriam adotar a linguagem e
os pontos de vista da ralé. Através do Exército, os jesuítas ganhariam o controle do poder civil
corrupto, e o caminho estaria aberto para um golpe de Estado sem sangue.
Enquanto isso, apenas a família Dreyfus tentava, por meios bizarros, salvar da Ilha do Diabo o
seu parente, e apenas alguns judeus preocupavam-se com sua posição nos salões antissemitas e no Exército ainda mais antissemita. Obviamente, não
havia motivo de esperar que um ataque ao Exército ou à sociedade viesse daquele lado. Pois não
era o desejo único dos judeus continuarem a ser aceitos na sociedade e tolerados nas forças
armadas? Ninguém nos círculos militares ou civis precisava perder o sono por causa deles.[69] Foi
embaraçoso, portanto, quando transpirou que, no gabinete de espionagem do Estado-Maior,
existia um alto oficial que, embora dotado de uma boa formação católica, excelentes
perspectivas militares, "adequada" dose da antipatia pelos judeus, ainda não havia adotado o
princípio de que o fim justifica os meios. Esse homem, completamente divorciado do
classicismo social e da ambição profissional, era Picquard, e a esse espírito simples, calmo e
politicamente desinteressado o Estado-Maior iria em breve dizer um "basta". Picquard não era
herói, e certamente não era um mártir. Era apenas aquele tipo comum de cidadão com interesse
normal pelos negócios públicos que, na hora do perigo (mas não um minuto antes), se ergue
para defender o país da mesma forma como cumpre seus deveres diários, sem discutir.[70]
Contudo, a causa só se tornou séria quando, após muita demora e hesitação, Clemenceau
finalmente se convenceu de que Dreyfus era inocente e de que a república estava em perigo. No
começo da luta, apenas um punhado de escritores e eruditos de renome aderiram à causa: Zola,
Anatole France, Emile Duclaux, o historiador Gabriel Monod e Lucien Herr, bibliotecário da
Ecole Normale. A estes deve acrescentar-se o pequeno e, na época, insignificante círculo de
jovens intelectuais que iriam mais tarde fazer história nos Cahiers de Ia Quinzaine.[71] Essa era a
lista completa dos aliados de Clemenceau. Não havia um grupo político sequer, nem um único
político de reputação, disposto a lutar ao seu lado. Clemenceau abordou a questão com grandeza
porque não arremetia contra um determinado erro de justiça, mas se estribava em coisas
"abstratas" como Justiça, Liberdade e Virtude Cívica. Estribava-se, enfim, naqueles mesmos
conceitos que haviam sido a essência do antigo patriotismo jacobino, e contra os quais muita
lama e insulto já haviam sido atirados. Ã medida que o tempo passava e, indiferente a ameaças e
decepções, Clemenceau continuava anunciando as mesmas verdades; ao transformá-las em
exigências, fazia os nacionalistas perderem terreno. Os seguidores de homens como Barres, que
havia acusado os partidários de Dreyfus de se perderem num "torvelinho de metafísica", vieram
a compreender que as abstrações do "Tigre" estavam, na verdade, mais próximas das realidades políticas que a limitada
inteligência de comerciantes falidos ou o tradicionalismo estéril de intelectuais fatalistas.[72] A
atitude concreta dos nacionalistas realistas terminou por levá-los a um fim que foi tão bem
exemplificado naquela história impagável que conta como Charles Maurras teve "a honra e o
prazer", durante a Segunda Guerra, ainda em 1939, de conhecer, em sua fuga para o sul, uma
astróloga que lhe explicou o significado político dos acontecimentos recentes e o aconselhou a
colaborar com os nazistas.[73] Embora o antissemitismo ganhasse terreno durante os três anos que se seguiram à prisão de
Dreyfus, antes do início da campanha de Clemenceau, e embora a imprensa antijudaica atingisse
uma circulação comparável à dos jornais principais, as ruas haviam permanecido calmas. Foi
somente quando Clemenceau começou a publicar seus artigos em L 'Aurore, quando Zola
publicou J'accuse, e quando o tribunal de Rennes iniciou inabilmente a série de julgamentos e
revisões, que a ralé entrou em ação. Cada lance dos partidários de Dreyfus (que se sabiam em
minoria) era seguido de perturbação mais ou menos violenta nas ruas.[74] O modo como o Estado
Maior organizou a ralé foi notável. A pista leva diretamente do Exército ao Libre Parole, que,
direta ou indiretamente, através de seus artigos ou da intervenção pessoal de seus editores,
mobilizou estudantes, monarquistas, aventureiros e simples bandidos, e atirou-os nas ruas. Se
Zola dizia uma palavra, imediatamente suas janelas eram apedrejadas. Se Scheurer-Kestner
escrevia ao ministro das Colônias, era imediatamente agredido na rua, enquanto os jornais
dirigiam indecentes ataques à sua vida privada. E todos os relatos concordam que se Zola,
quando foi acusado, tivesse sido absolvido, nunca teria saído vivo do tribunal.[*]
O grito "Morte aos judeus!" varreu o país. Em Lyon, Rennes, Nantes, Tours, Bordeaux,
Clermont-Ferrant e Marselha — na verdade, em toda parte —, explodiam tumultos antissemitas,
invariavelmente atribuíveis à mesma fonte. A indignação popular espocava em todo canto, no
mesmo dia e exatamente à mesma hora.[75] Sob a chefia de Guérin, a ralé assumia ares militares.
Tropas de choque antissemitas surgiam nas ruas para assegurar-se de que todo comício pró-Dreyfus terminasse em sangreira. A cumplicidade da polícia era patente em toda parte.[76]
A figura mais moderna entre os adversários de Dreyfus era provavelmente Jules Guérin. Falido
no comércio, havia iniciado sua carreira política como alcaguete da polícia, e adquiriu aquele
instinto de disciplina e de organização que é a marca invariável do submundo. Mais tarde, iria
canalizar esse instinto para fins políticos, tornando-se fundador e chefe da Ligue Antisémite. A
alta sociedade teve nele seu primeiro herói criminoso. Em sua adulação de Guérin, a sociedade
burguesa deixou bem claro que havia definitivamente rompido com os próprios padrões de
moral e ética. Por trás da Ligue havia dois membros da aristocracia, o duque de Orléans e o
marquês de Mores. Esse último havia perdido a fortuna na América, e tornou-se famoso por
organizar os açougueiros de Paris numa brigada de rufiões.
A mais eloquente dessas tendências modernas foi o ridículo ataque ao chamado Forte Chabrol.
Foi aí que a elite da Ligue Antisémite se reuniu, quando a polícia finalmente decidiu prender o
seu líder. As instalações eram de alta perfeição técnica. "As janelas eram protegidas por
persianas de ferro. Havia um sistema de campainhas elétricas e telefones do porão ao teto. A
mais ou menos cinco metros por trás da maciça porta da entrada, que estava sempre trancada e
aferrolhada, havia forte grade de ferro fundido. À direita, entre a grade e a porta principal, havia
pequena porta, também coberta por uma placa de ferro, atrás da qual as sentinelas, escolhidas a
dedo dentre as legiões de açougueiros, montavam guarda dia e noite."[77]
Max Régis, instigador dos pogroms argelinos, é outro desses homens que representava as velhas
ideias sob aspectos modernos. Foi o jovem Régis que uma vez incitou uma animada turba
parisiense a "regar a árvore da liberdade com o sangue dos judeus". Régis representava aquele
setor do movimento que esperava galgar o poder através de métodos legais e parlamentares.
Seguindo essa orientação, fez-se eleger prefeito de Argel e usou de sua posição para
desencadear os pogroms nos quais vários judeus foram mortos, mulheres judias foram
violentadas e lojas de judeus foram pilhadas. Foi a ele também que o polido e culto Edouard
Drumont, o mais famoso antissemita francês, deveu sua cadeira no Parlamento.
O novo em tudo isso não era a atividade da ralé; esta tinha abundantes precedentes. O novo e
surpreendente na época — embora demasiado comum para nós — era a organização da ralé e o
fato de que adoravam seus líderes como heróis. A ralé tornou-se o agente direto daquele
nacionalismo "concreto" esposado por Barres, Maurras e Daudet, que, juntos, constituíam o que
sem dúvida era uma espécie de elite de jovens intelectuais. Esses homens, que menosprezavam
o povo e apenas recentemente haviam, eles próprios, emergido de um desastroso e decadente culto da estética, viram na ralé uma expressão viva da "força" viril e
primitiva. Foram eles e suas teorias que primeiro identificaram a ralé com o povo e converteram
seus líderes em heróis nacionais.[78] Foi a sua filosofia do pessimismo e o seu prazer da ruína que
constituíram o primeiro sinal do iminente colapso da intelectualidade europeia.
Nem mesmo Clemenceau estava imune à tentação de identificar a ralé com o povo. O que o
tornava especialmente propenso a esse erro era a atitude, consistentemente ambígua, do Partido
Socialista em relação à questão da justiça "abstrata". Nenhum partido, inclusive o socialista,
estava disposto a lutar pela justiçaperíe, a "tomar posição, para o que der e vier, em favor da
justiça, o único elo inquebrável de união entre homens civilizados".[79] Os socialistas defendiam
os interesses dos trabalhadores; os oportunistas, os da burguesia liberal; os coligacionistas, os
das classes católicas superiores; e os radicais, os da pequena burguesia anticlerical. Os
socialistas tinham a grande vantagem de falar em nome de uma classe homogênea e unida.
Diferentemente dos partidos burgueses, não representavam uma sociedade que se havia
fragmentado em numerosos grupos. Contudo, preocupavam-se primária e essencialmente com
os seus interesses de classe. Não os estorvava qualquer obrigação mais alta para com a
solidariedade humana, e não tinham a menor ideia do que realmente fosse a vida comunal.
Típica de sua atitude era a observação feita por Jules Guesde, principal líder socialista junto
com Jaurès, de que "a lei e a honra são meras palavras".
O niilismo que caracterizava os nacionalistas não era monopólio dos anti-dreyfusards. Pelo
contrário, grande parte dos socialistas e muitos dos que defendiam Dreyfus, como Guesde,
falavam a mesma linguagem. Se o católico La Croix observava que "já não é mais uma questão
de saber se Dreyfus é culpado ou inocente, mas apenas de quem irá vencer, os amigos do
Exército ou os seus inimigos", semelhante ponto de vista bem poderia ter sido expresso, mutatis
mutandis, pelos partidários de Dreyfus.[80] Não apenas a ralé, mas considerável segmento do
povo francês, se declarou, na melhor das hipóteses, bastante desinteressado pelo fato — em si
essencial — de um grupo da população ser excluído dos benefícios da lei.
Assim que a ralé começou sua campanha de terror contra os partidários de Dreyfus, encontrou
diante de si o caminho aberto. Como atesta Clemenceau, os trabalhadores de Paris pouco se
importavam com o caso. Se os vários elementos da burguesia discutiam entre si, isso, pensavam
eles, pouco afetava seus interesses. "Com o consentimento aberto do povo", escreveu
Clemenceau, "eles proclamaram diante do mundo a falência de sua 'democracia'. Graças a eles, um povo soberano é
despojado do seu trono de justiça, privado de sua infalível majestade. Pois não há como negar que esse
mal caiu sobre nós com a inteira cumplicidade do próprio povo. (...) O povo não é Deus. Qualquer um
poderia ter previsto que essa nova divindade iria tombar do seu pedestal. Um tirano coletivo, dominando
de ponta a ponta um país, não é mais aceitável que um tirano único refestelado no trono."[81]
Finalmente, Clemenceau convenceu Jaurès de que a violação dos direitos de um homem era a violação
dos direitos de todos. Mas, se foi bem-sucedido quanto a Jaurès, é porque os transgressores eram
inveterados inimigos do povo desde a Revolução: a aristocracia e o clero. Foi contra os ricos e o clero, e
não a favor da república, não a favor da justiça e da liberdade, que finalmente os trabalhadores saíram às
ruas. É verdade que tanto os discursos de Jaurès como os artigos de Clemenceau cheiravam à antiga
paixão revolucionária pelos direitos humanos. Também é verdade que essa paixão era suficientemente
forte para reagrupar o povo na luta, mas antes tiveram de convencer-se de que o que estava em jogo não
era apenas a justiça e a honra da república, mas também seus próprios interesses de classe. Na verdade,
grande número de socialistas, dentro e fora do país, ainda consideravam um erro imiscuir-se (como
diziam) nas brigas intestinas da burguesia, ou cuidar de salvar a república.
O primeiro a fazer com que os trabalhadores abandonassem, pelo menos parcialmente, essa atitude de
indiferença foi aquele grande amigo do povo, Emile Zola. Mas, em sua famosa acusação à república, ele
foi também o primeiro a afastar-se da apresentação de fatos políticos precisos e ceder às paixões da ralé,
evocando o fantasma da "Roma Secreta". Clemenceau relutou em adotar esse tom, embora Jaurès o
fizesse com entusiasmo. A verdadeira façanha de Zola, cuja vida e obra haviam exaltado o povo a ponto
de atingir os limites da idolatria, foi a coragem audaz e resoluta para desafiar, combater e finalmente
conquistar as massas, nas quais, como Clemenceau, ele mal sabia distinguir a ralé do povo. "Já houve
homens que resistiram aos mais poderosos monarcas e se recusaram a inclinar-se diante deles, mas tem
havido poucos capazes de resistir à multidão, e sozinhos enfrentar as massas mal orientadas, de encarar
desarmado o seu implacável frenesi e, de braços cruzados, ousar dizer não!, quando o que a massa exige é
um sim. Esse homem foi Zola!"[82]
Mal havia aparecido J'accuse, os socialistas de Paris realizaram seu primeiro comício e votaram a favor
de uma revisão do processo Dreyfus. Mas, apenas cinco dias mais tarde, 32 autoridades socialistas
emitiram uma declaração no sentido de que a sorte de Dreyfus, "o inimigo da classe", não era de sua
conta. Apoiavam essa declaração numerosos líderes do partido em Paris. Embora a dissensão em suas
fileiras continuasse durante todo o Caso, o partido contou com número suficiente de defensores de
Dreyfus para evitar que a Ligue Antisemite controlasse as ruas daí por diante. Um comício socialista chegou ao ponto de estigmatizar o
anti-semitismo como "nova forma de reação". Contudo, alguns meses depois, por ocasião das eleições
parlamentares, Jaurès não foi reeleito e, logo depois, quando Cavaignac, ministro da Guerra, presenteou a
Câmara com um discurso atacando Dreyfus e louvando o Exército como indispensável, os delegados
socialistas resolveram, com apenas dois votos em contrário, colocar nos muros de Paris cartazes com o
texto do discurso. Da mesma forma, quando a grande greve parisiense eclodiu em outubro do mesmo ano,
Münster, o embaixador alemão, pôde confidencialmente informar Berlim de que, "no que concerne às
massas, não se trata absolutamente de questão política. Os trabalhadores querem apenas aumento de
salário, o que terminarão conseguindo. Quanto ao processo Dreyfus, nem pensavam em se envolver por
ele".[83]
Em termos gerais, então, quem eram os defensores de Dreyfus? Quem foram aqueles 300 mil franceses
que tão avidamente devoraram Taccuse de Zola e acompanharam religiosamente os editoriais de
Clemenceau? Quem foram os homens que, na questão Dreyfus, terminaram por dividir cada classe, cada
família da França em dois lados opostos? A resposta é simples: não constituíam qualquer partido ou
grupo homogêneo. É certo que provinham mais das classes inferiores que das superiores, incluindo — o
que comprova a afirmação — mais médicos que advogados e funcionários civis. De modo geral, porém,
formavam uma mistura de vários elementos: homens tão diversos entre si como Zola e Péguy, ou Jaurès e
Picquard, homens que no dia seguinte se separariam e tomariam caminhos diferentes. "Vêm de partidos
políticos e grupos religiosos que nada têm em comum e, às vezes, estão até em conflito entre si. (...) Não
se conhecem uns aos outros. Já se digladiaram e a qualquer dia lutarão de novo. Mas não se enganem:
esses homens é que são a elite da democracia francesa."[84] Se Clemenceau tivesse tido bastante
autoconfiança, naquela época, para considerar que apenas aqueles que lhe davam ouvidos eram o
verdadeiro povo da França, não teria sido presa daquele orgulho fatal que marcou o resto de sua carreira.
O que ele experimentou durante o Caso Dreyfus motivou a sua descrença no povo, seu desprezo pelos
homens e, finalmente, a certeza de que ele, e somente ele, poderia salvar a república. Nunca havia podido
rebaixar-se a aplaudir as momices da ralé. Portanto, quando começou a identificar a ralé com o povo, o
chão fugiu de seus pés, e ele submeteu-se àquele teimoso afastamento que o distinguiu daí por diante.
A desunião do povo francês era patente em cada família. Caracteristicamente, porém, encontrou
expressão política apenas nas fileiras dos socialistas. Todos os outros, bem como todos os grupos
parlamentares, eram unanimemente contra Dreyfus quando começou a campanha por um novo
julgamento. Mas os partidos burgueses já não representavam os verdadeiros sentimentos do eleitorado,
pois a mesma desunião, tão patente entre os socialistas, prevalecia entre quase todos os segmentos da
população. Por toda parte uma minoria aceitava o apelo de Clemenceau por justiça, e nessa minoria heterogênea agrupavam-se os
partidários de Dreyfus. Sua luta contra o Exército e contra a cumplicidade corrupta da
República que o apoiava foi o fator dominante da política interna da França desde fins de 1897
até a inauguração da Exposição em 1900. Exerceu também considerável influência na política
externa do país. Não obstante, todo esse esforço, que iria finalmente resultar num triunfo
parcial, ocorreu exclusivamente fora do Parlamento. Nessa assembleia chamada representativa,
que compreendia seiscentos delegados de toda cor e matiz da burguesia e das classes
trabalhadoras, havia em 1898 apenas dois partidários de Dreyfus, e um deles, Jaurès, não foi
reeleito.
O que mais nos perturba no Caso Dreyfus é que não foi apenas a ralé que teve de agir com
métodos extraparlamentares. Toda aquela minoria, embora lutasse como lutava pelo
Parlamento, pela democracia e pela república, era também forçada a travar sua luta fora da
Câmara. Mas, enquanto uns usavam as ruas, os outros recorriam à imprensa e aos tribunais — e
essa foi a única diferença entre os dois elementos. Em outras palavras, toda a vida política da
França durante a crise Dreyfus se passou fora do Parlamento. Nem os vários votos
parlamentares a favor do Exército e contra um novo julgamento invalidam de modo algum essa
conclusão. É importante não esquecer que, quando o sentimento parlamentar começou a mudar,
pouco antes da inauguração da Exposição Internacional de Paris, o ministro Gallifet pôde dizer
com justeza que isso absolutamente não representava a atitude da nação.[85] Por outro lado, o voto
contra o novo julgamento não deve ser interpretado como endosso da política de golpe de
Espado que os jesuítas e certos antissemitas estavam tentando realizar com o auxílio do
Exército.[86] Devia-se, antes, à mera resistência contra qualquer mudança no status quo.
Realmente, uma maioria igualmente esmagadora na Câmara teria rejeitado uma ditadura clérigo
militar. Os membros do Parlamento que haviam aprendido a ver a política como a representação
profissional dos capitais investidos estavam naturalmente ansiosos por conservar aquele estado
de coisas do qual dependiam tanto sua "vocação" quanto os seus lucros. O processo Dreyfus
revelou, além disso, que também o povo desejava que seus representantes cuidassem dos
interesses peculiares de todos, em vez de funcionarem como estadistas. Era positivamente
insensato mencionar o caso na propaganda eleitoral. Se isso fosse devido unicamente ao antissemitismo, a situação dos partidários de Dreyfus teria certamente sido desesperadora. Na verdade, durante as eleições eles já contavam com apoio considerável
entre a classe trabalhadora. No entanto, nem mesmo aqueles que apoiavam Dreyfus desejavam
ver essa questão política imiscuída nas eleições. Foi realmente por insistir em fazer dela o pivô
de sua campanha que Jaurès deixou de ser reeleito.
Se Clemenceau e os partidários de Dreyfus conseguiram convencer grandes segmentos de todas
as classes a exigirem novo julgamento, os católicos reagiram em bloco; entre eles não houve
divergências de opinião. O que os jesuítas fizeram ao manobrar a aristocracia e o Estado-Maior
foi feito para as classes média e baixa pelos assuncionistas, cujo órgão, La Croix, tinha a maior
circulação de todos os jornais católicos da França.[87] Ambos concentraram sua agitação contra a
república em torno dos judeus. Ambos se apresentaram como defensores do Exército e do bem
estar público contra as maquinações do "judaísmo internacional". Mais extraordinário, porém,
que a atitude dos católicos da França foi o fato de estar toda a imprensa católica do mundo
unanimemente contra Dreyfus. "Todos os jornalistas marcharam e ainda estão marchando por
ordem de seus superiores."[88] Ã medida que o caso avançava, tornava-se cada vez mais claro que
a agitação contra os judeus na França seguia uma linha internacional. Assim, o Civiltà cattolica declarou que os judeus deviam ser excluídos da nação em toda parte, na França, na Alemanha,
na Áustria e na Itália. Os políticos católicos foram os primeiros a compreender que a política do
poder, em nossos dias, deve basear-se no jogo das ambições coloniais. Foram, portanto, os
primeiros a ligar o antissemitismo ao imperialismo, declarando que os judeus eram agentes da
Inglaterra e, assim, identificavam com a anglofobia o antagonismo aos judeus.[89] O processo
Dreyfus, no qual os judeus eram figuras centrais, deu-lhes, desta forma, uma boa oportunidade
para que jogassem seu jogo. Se a Inglaterra havia tomado o Egito dos franceses, a culpa era dos
judeus,[90] enquanto o movimento a favor de uma aliança anglo-americana se devia, naturalmente,
ao "imperialismo dos Rothschild".[91] Que esse jogo não se limitava à França ficou bem claro
quando o pano caiu sobre a cena. Em fins de 1899, quando Dreyfus havia sido indultado, e
quando a opinião pública francesa havia recuado, receando um planejado boicote à Exposição,
bastou uma entrevista com o papa Leão XIII para sustar a propagação do antissemitismo no
mundo.[92] Mesmo nos Estados Unidos, onde a defesa de Dreyfus era particularmente violenta entre os não-católicos, era possível discernir na imprensa católica, a
partir de 1897, acentuado ressurgimento de sentimentos antissemitas que, no entanto, se
acalmaram da noite para o dia após a entrevista de Leão XIII.[93]
continua página 129...
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Parte I Antissemitismo (3. Os Judeus e a Sociedade: 3.4.4)
______________________[60] Cf. o artigo de Clemenceau de 2 de fevereiro de 1898, em op. cit. Quando à futilidade de tentar arrebanhar os trabalhadores
com lemas antissemitas, e principalmente sobre a tentativa de Léon Daudet, ver o escritor monarquista Dimier, Vingt ans d'Action
Française, Paris, 1926.
[61] Muito característicos, nesse ponto, são os vários retratos da sociedade da época em J. Reinach, op. cit., I, pp. 233ss; III, p. 141:
"As senhoras da sociedade acompanhavam o passo de Guérin. A linguagem delas (que mal ia além de seus pensamentos) teria
horrorizado uma amazona do Daomé (...)". De especial interesse a esse respeito é um artigo de André Chevrillon, "Huit jours à Rennes", na Grande Revue de fevereiro de 1900. Conta ele, inter alia, o seguinte incidente revelador: "Um médico,
falando a alguns amigos meus a respeito de Dreyfus, fez o comentário de que gostaria de torturá-lo. 'E eu quisera',
acrescentou uma das senhoras, 'que ele fosse inocente, pois sofreria mais'".
[62] Entre os intelectuais encontrava-se, bastante estranhamente, Paul Valéry, que contribuiu com três francos, non
sans réflexion.
[63] J. Reinach, op. cit., I, 233.
[64] Um estudo da superstição europeia demonstraria provavelmente que os judeus se tornaram objetos dessa
modalidade de superstição típica do século XIX em data bastante recente. Foram precedidos pelos rosacruzes,
templários, jesuítas e pela Livre-Maçonaria. O tratamento da história do século XIX ressente-se muito da falta de tal
estudo.
[65] Vide "II caso Dreyfus", em Civiltà cattolica (5 de fevereiro de 1898). Entre as exceções à afirmação anterior, a
mais notável é o jesuíta Pierre Charles Louvain, que denunciou os "Protocolos dos sábios do Sião".
[66] Cf. Martin du Gard, Jean Barois, pp. 272ss, e Daniel Halévy, em Cahiers de Ia Quin-zaine, série II, caderno 10,
Paris, 1910.
[67] Cf. Georges Sorel, La révolution dreyfusienne, Paris, 1911, pp. 70-1.
[68] A que ponto os membros do Parlamento estavam de mãos atadas é demonstrado pelo caso de Scheurer-Kestner,
um dos seus melhores elementos e vice-presidente do Senado. Assim que deu entrada em seu protesto contra o
julgamento, o Libre Parole proclamou o fato de que seu genro tinha estado envolvido no escândalo do Panamá. Ver
Herzog, op. cit., sob data de novembro de 1897.
[69] Cf. Brogan, op. cit., livro VII, capítulo 1: "O desejo de esquecer o assunto [isto é, o Caso Dreyfus] não era raro entre os judeus
franceses, especialmente entre os mais ricos".
[70] Imediatamente após ter feito suas descobertas, Picquard foi banido para um perigoso posto em Túnis. Fez então seu
testamento, denunciou toda a trama, e depositou com o seu advogado uma cópia do documento. Alguns meses mais tarde, quando se
descobriu que ele ainda estava vivo, começou a chegar uma enxurrada de cartas que o comprometiam e o acusavam de cumplicidade
com o "traidor" Dreyfus. Foi tratado como um gângster que ameaçasse "soltar a língua". Quando se viu que tudo isso era inútil, ele
foi preso, expulso do Exército ao som dos tambores e despojado de suas condecorações, tendo tudo suportado com serena
equanimidade.
[71] A esse grupo, liderado por Charles Péguy, pertenciam o jovem Romain Rolland, Sua-rez, Georges Sorel, Daniel Halévy e
Bernard Lazare.
[72] Cf. M. Barres, Scènes et doctrines du nationalisme, Paris, 1902.
[73] Ver Yves Simon, op. cit., pp. 54-5.
[74] As salas dos mestres na Universidade de Rennes foram arrasadas depois que cinco professores se declararam a favor de novo
julgamento. Depois da publicação do primeiro artigo de Zola, estudantes monarquistas fizeram uma demonstração diante dos
escritórios do Figaro, após a qual o jornal desistiu de publicar outros artigos do mesmo tipo. O editor do La Bataille, pró-Dreyfus,
foi espancado na rua. Os juízes do Tribunal de Cassação, que finalmente revogaram o veredicto de 1894, declararam unanimemente
que haviam sido ameaçados de agressão. Os exemplos poderiam multiplicar-se.
[*] Clemenceau foi mais contundente. "Se Zola fosse absolvido, ninguém de nós sairia vivo", disse no Senado a 11 de dezembro de
1906. (Nota do editor de tradução francesa.)
[75] Em 18 de janeiro de 1898, ocorreram demonstrações antissemitas em Bordeaux, Marselha, Clermont-Ferrant, Nantes, Rouen e
Lyon. No dia seguinte, eclodiram distúrbios estudantis em Rouen, Toulouse e Nantes.
[76] O exemplo mais cru foi o do chefe de polícia de Rennes, que aconselhou o professor Victor Basch, quando sua casa foi
assaltada por uma multidão de 2 mil pessoas, a pedir demissão, já que ele não lhe podia garantir segurança.
[77] Cf. Bernanos, op. cit., p. 347.
[78] No tocante a essas teorias, ver especialmente Charles Maurras, Au Signe de Fore: souvenirs de Ia viepolitique; VAffaire
Dreyfus et lafondation de VAction Française, Paris, 1931; M. Barres, op. cit.; Léon Daudet, Panorama de Ia Troisième
Republique, Paris, 1936.
[79] Cf. Clemenceau, "À Ia derive", emop. cit., p. 158.
[80] Foi precisamente isso que tanto decepcionou os defensores de Dreyfus, especialmente o círculo em torno de Charles
Péguy. Essa perturbadora semelhança entre os defensores e os adversários de Dreyfus é o assunto do romance de Martin du
Gard, Jean Barois, 1913.
[81] Prefácio a Contre Ia Justice, 1900.
[82] Clemenceau, em discurso diante do Senado a 11 de dezembro de 1906; cf. Weil, op. cit., pp. 112-3.
[83] Ver Herzog, op. cit., sob data de 10 de outubro de 1898.
[84] "K. V. T.", op. cit., p. 608.
[85] Gallifet, ministro da Guerra, escreveu para Waldeck-Rousseau: "Não esqueçamos que a grande maioria do povo
na França é antissemita. Nesta situação, portanto, temos o Exército e a maioria dos franceses junto com os deputados
e senadores e todos os agitadores; do outro lado, há o ministério, os dreyfusards e o estrangeiro (...)" - Cf. J. Reinach,
op. cit., V, 580.
[86] A mais conhecida dessas tentativas foi a de Déroulède, que, enquanto assistia ao funeral do presidente Félix
Faure, em fevereiro de 1899, procurou incitar ao motim o general Roget. Os embaixadores e encarregados de
negócios alemães em Paris relatavam tentativas semelhantes de meses a meses. A situação é bem definida por Barres,
op. cit., p. 4: "Em Rennes encontramos nosso campo de batalha. Só precisamos de soldados ou, mais precisamente, de
generais — ou, ainda mais precisamente, de um general". Só que não foi por acaso que esse general não existia.
[87] Brogan vai ao ponto de culpar os assuncionistas por toda a agitação clerical.
[88] "K. V. T.", emop. cit., p. 597.
[89] "O estimulo inicial do Caso muito provavelmente veio de Londres, onde a missão do Congo-Nilo de 1896-1898
estava causando certo grau de inquietação"; é o que diz Maurras no Action Française (14 de julho de 1935). A
imprensa católica de Londres defendia os jesuítas; ver "The Jesuits and the Dreyfus case", em The Month, vol. XVIII
(1899).
[90] Civiltà cattolica, 5 de fevereiro de 1898.
[91] Ver o artigo particularmente característico do Rev. George McDermot, C. S. P., "Mr. ChamberlaüVs foreign
policy and the Dreyfus case", na revista mensal americana Catholic World, vol. LXVI, setembro de 1898.
[92] Cf. Lecanuet, op. cit., p. 188.
[93] Cf. Rose A. Halperin, op. cit., pp. 59, 77ss.
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