Fiódor Dostoiévski
Tradução portuguesa por José Geraldo Vieira
Quarta Parte
8..
continuando...
Ela também estava vestida simplesmente, toda de
preto. Levantou-se para saudá-los, mas não sorriu e nem estendeu a mão ao
príncipe.
Seus olhos atentos e inquietos pousaram sobre Agláia. As duas sentaram- se a
pequena distância uma da outra. Agláia, em um sofá, a um canto da sala;
Nastássia Filíppovna rente à janela. Liév Nikoláievitch e Parfión não se sentaram
e nem ela os convidou a isso.
O príncipe olhou com perplexidade e mesmo,
depois, com angústia para Rogójin que continuava com o mesmo sorriso. O
silêncio durou pouco, logo uma expressão de vivacidade percorrendo todo o rosto
de Nastássia Filíppovna. O seu olhar brilhou, obstinado, firme e cheio de rancor,
não deixando um só segundo de alternar de um visitante para outro.
Agláia estava evidentemente perturbada, mas apesar da confusão não parecia
intimidada. Desde que penetrara na sala não erguera os olhos para a rival,
mantendo-os no assoalho, com ar de reflexão, apenas de quando em quando
procurando olhar para as paredes e os móveis com naturalidade. Havia uma
secreta expressão de mal-estar em seu rosto, como se receasse uma
contaminação. Maquinalmente arranjou a orla do vestido e se sentou mais para a
beira do sofá, fazendo isso com gestos e movimentos provavelmente inconscientes. Mas essa atitude mutável tornava insultuoso o seu comportamento
concentrado. Por fim olhou bem para Nastássia Filíppovna e leu
instantaneamente tudo quanto se ocultava no enigmático brilho dos olhos da rival.
A mulher compreendeu a mulher. E Agláia estremeceu.
- Naturalmente sabe o
motivo do pedido que fiz para que viesse de Petersburgo - disse com voz baixa,
fazendo duas pausas em período tão curto.
- Não, não sei de nada - respondeu
Nastássia Filíppovna de modo abrupto e seco.
Agláia enrubesceu. Repentinamente a feriu, como fenômeno incrível, estar
sentada ali com tal criatura e presa a uma sua resposta. Ao primeiro som da voz
de Nastássia Filíppovna um calafrio a percorreu, o que logo a outra de modo
muito claro percebeu.
- Compreende tudo, mas por cálculo pretende não entender... - disse Agláia,
quase em um sussurro, olhando logo para o chão.
- Por que faria eu isso? Por que
deveria eu fazer isso? - disse Nastássia e sorriu.
- Para adquirir vantagem sobre a minha situação de estar aqui nesta casa - atalhou Agláia de modo deselegante e inconveniente.
- Vós, e não eu, sois a
responsável por vossa situação - opinou Nastássia Filíppovna, com veemência. - Não estais aqui por convite meu. Eu sim é que aqui me acho obedecendo a um
convite vosso; e ainda ignoro qual seja a razão.
Agláia ergueu orgulhosamente a
cabeça:
- A sua língua é a arma de que dispõe. E não vim lutar batendo boca.
- Ah! Então
viestes lutar comigo? Pois acreditai que vos julgava mais fina.
Olharam uma
para a outra sem esconder seus mútuos despeitos. Uma delas era a mulher que
havia escrito aquelas cartas à outra. E agora, ao primeiro encontro, tudo caía aos
pedaços. E ainda assim nenhuma das quatro pessoas que se achavam naquela
sala parecia haver percebido tão estranho fenômeno.
O príncipe, que um dia
antes nem por sonhos admitira a possibilidade disso, estava ali, olhando e ouvindo,
como se desde muito houvesse previsto tudo. O mais fantástico dos sonhos se
convertia assim nitidamente na mais viva e cabal realidade. Uma dessas
mulheres desprezava naquele momento a outra, e de tal maneira, querendo lhe
exprimir com tamanha intensidade esse desprezo (viera somente para isso,
conforme Rogójin declararia no dia seguinte) que, não contando de antemão
com o desordenado intelecto e a alma tenaz da rival, cuidou que esta não adotara
previamente nenhuma idéia a usar contra tal desprezo maligno tão tipicamente
feminino.
O príncipe certificou-se logo que
Nastássia Filíppovna espontaneamente não faria menção às cartas. Essas cartas
o afligiam agora a ponto de dar metade de sua vida para que Agláia não se
referisse a elas.
Mas parece que Agláia repentinamente se contagiou na atmosfera de contenção
pois, já se dominando, disse:
- A senhora me compreendeu mal. Não vim lutar,
muito embora não a estime... Eu vim.., apenas conversar, como um ser humano
se dirigindo a outro ser humano. Quando a mandei procurar já havia decidido o
que lhe haveria de dizer e não quero me afastar agora de uma tal decisão,
mesmo que não fosse neste momento compreendida de todo. Seria pior para
uma de nós, ou melhor... não para mim! Desejei responder-lhe ao que me
escreveu e vim fazê-lo pessoalmente por me parecer mais conveniente. Ouça
agora a minha resposta a todas as suas cartas: tive pelo Príncipe Liév
Nikoláíevitch, desde o dia em que o conheci e principalmente depois que me
contaram o que lhe aconteceu na recepção da senhora, tive pena dele porque é
um homem tão puro de coração que chegou a acreditar, mercê de sua
ingenuidade, que poderia ser feliz com... uma mulher... de tal caráter. Do que
temi que lhe viesse a suceder tudo já se deu, pois a senhora foi incapaz de amá-lo. Antes, o torturou e o abandonou. Não o pôde amar porque é muito orgulhosa...
Não, expressei-me mal, porque... é muito vã... Ainda não é o termo que quero...
Porque o seu egoísmo deu em crescer... crescer até ao ponto de vir a ser loucura,
do que as suas cartas são uma prova concludente. Não podia amar um homem
simples como ele e muito provavelmente no íntimo o desprezava e achava
ridículo. A senhora não pode amar coisa nenhuma, exceto a sua própria vergonha
e esse seu contínuo pensamento, que já é mania, de que foi posta pelos homens
debaixo da ignomínia e da humilhação. Se a sua ignomínia fosse menor e,
pudesse, por isso, se libertar dela de vez, seria muito menos infeliz... - Agláia
sentia prazer em pronunciar palavras ponderadas e desde muito preparadas, mas
ainda assim, agora, pronunciava, demasiado apressadamente, essas palavras que
tinha escolhido antes da entrevista; mas, apesar do nervoso, examinava o efeito
delas no rosto contraído de Nastássia Filíppovna. - Deve a senhora se recordar
bem que ele me escreveu uma carta naquela ocasião. Sei que a senhora soube e
leu essa carta, pois ele me disse, depois. Pois bem, aquela carta me fez entender
tudo e de maneira bem correta. Ele já teve ocasião de me confirmar tudo isto
que lhe estou agora quase que repetindo palavra por palavra. Depois da carta,
esperei.
Estava certa de que a senhora viria para aqui porque sem Petersburgo a
senhora não pode existir. A senhora ainda é muito nova e bem parecida para as
províncias. Aliás, estas palavras não são minhas - acrescentou enrubescendo
vivamente e desde então a coloração não lhe abandonou mais as faces, até
acabar de falar. - Quando revi o príncipe, me senti cruelmente tocada e ferida,
por causa dele. Não ria. Se a senhora rir é porque não está capacitada para
entender o que estou dizendo.
- Bem vedes que não estou rindo - disse Nastássia Filíppovna de um modo grave
e quase lúgubre.
- Aliás, tanto se me dá. Pode rir, se quiser. Às primeiras perguntas que a ele
dirigi, me respondeu que tinha cessado desde muito de a amar e que até a sua
lembrança lhe causava tortura, mas que... sentia pena da senhora... e que quando
pensava na senhora o coração lhe ficava trespassado. Tenho a dizer-lhe, também,
que nunca, em minha vida, encontrei um homem como ele, de uma simplicidade
tão nobre e de uma confiança tão ilimitada. Compreendi, só pelo modo dele
falar, que quem quisesse o podia enganar e que ele perdoaria quem o enganasse;
eis porque o fiquei querendo mais.
Agláia parou um momento, como que
espantada, não acreditando ter ousado e podido pronunciar tais palavras. Mas, ao
mesmo tempo, um orgulho infinito apareceu em seus olhos. Agora parecia de
fato não se importar se “aquela outra mulher” se risse, imediatamente, ante a
confissão saída de sua boca.
- Já lhe disse tudo e agora, sem dúvida, entendeu o que quero da senhora.
- Talvez
tenha entendido, mas seria melhor se vós mesma mo dissésseis - respondeu
Nastássia Filíppovna, mansamente.
Houve um brilho de cólera no rosto de
Agláia.
- Queria que me fizesse saber - pronunciou com firmeza e de modo bem
perceptível - que direito tem de se misturar nos sentimentos dele por mim? Com
que direito ousou mandar-me aquelas cartas? Com que direito andou declarando
a ele e a mim que o ama, para abandoná-lo em seguida, por vontade própria,
fugindo de maneira tão degradante e insultante?
- Nunca declarei a ele, ou a vós,
que o amo - articulou Nastássia Filíppovna com esforço. - E tendes razão em dizer que fugi dele - acrescentou tão baixo que o tom foi
quase inaudível.
- Então nunca o declarou a mim, nem a ele? - gritou Agláia - E as suas cartas? Quem lhe pediu para começar lutando e pedindo que
eu me casasse com ele? Não era isso declaração? Por que se interpôs? Pensei, no
começo, que tentasse fazer erguer-se em mim uma aversão por ele, ao interferir
contra nós, obrigando-me, assim, a desistir. Foi só depois que adivinhei o que isso
tudo significava, Simplesmente imaginou que estava fazendo algo de heroico e de
maravilhoso trabalhando assim a favor de suas pretensões Como há de amá-lo,
se ama tanto a sua vaidade? Por que, então, não se foi simplesmente embora
daqui em vez de ficar a me escrever cartas tão absurdas? Por que então não se
casa com o homem que com generosidade a ama e a honra, com o lhe oferecer
a sua mão? E claro, porque se se casasse com Rogójin de que se haveria de
queixar? Ao contrário, teria feito muita honra a si mesma. Evguénii Pávlovitch
disse muito bem que a senhora leu Poesia demais e teve educação demasiada
para a sua... situação que é “saia e blusa” e quer ser “dalmática”; que vive na
indolência querendo heroísmos... Junte-se agora, a isso, que ele caracterizou tão
bem, a vaidade! E logo se tem uma explicação de tudo.
- E vós, não viveis na indolência?
Com excessiva rapidez e crueldade as coisas haviam chegado a um extremo tão
inesperado; inesperado, porque Nastássia Filíppovna, ao dirigir-se a Pávlovsk,
imaginava que tudo se passaria de maneira bem diferente, muito embora os seus
pressentimentos fossem antes maus do que bons. Agláia deixou-se levar de modo
tão absoluto pelo impulso do momento como se, estando a cair precipício abaixo,
não pudesse resistir à alegria tenebrosa da vingança. Era positivamente estranho
para Nastássia Filíppovna, ver Agláia neste estado. Olhou-a e não pôde acreditar
em seus olhos, ficando, nos primeiros instantes, completamente estupefata. E
apesar de, como dissera Evguénii Pávlovitch, ser uma mulher que havia lido
poesia demais, ou fosse uma louca como Míchkin estava convencido, de qualquer
modo, muito embora às vezes se comportasse com cinismo e impudência, ainda
assim estava longe de não ser uma mulher modesta, mansa e sincera (mais até
do que se poderia acreditar). Por mais cheia que andasse de ideias românticas,
de fantasias caprichosas e cismas egoísticas, ainda assim, havia nela muita coisa
de forte e de profundo!... O príncipe compreendeu isso. E agora a expressão do
seu rosto era de indizível sofrimento. Agláia percebeu, tremeu de desdém, e com
indescritível altivez disse em resposta à exclamação de Nastássia Filíppovna:
- Ousa dirigir-se deste modo a mim?
- Deveis ter-me ouvido mal - disse Nastássia Filíppovna, com surpresa - Como foi que me dirigi a vós?
- Se, realmente, queria ser uma mulher respeitável, por que, tão simplesmente,
não abandonou o seu sedutor, Tótskii, sem cenas teatrais? - disse Agláia. Subitamente, desviando a orientação da conversa.
- Que sabeis vós da minha
situação, para assim ousar julgar-me? - indagou Nastássía Filíppovna,
trêmula: estava ficando terrivelmente branca.
- Que sei? Pergunta isso a mim?
Sei que a senhora não foi trabalhar, mas que se meteu com um homem rico,
Rogójin, para fingir de anjo decaído. Não me espanta que Tótskii tente até se dar
um tiro, para se livrar de um tal anjo decaído.
- Não faleis assim! - Nastássia
Filíppovna fez um ar tanto de repulsa como de angústia. - Vós me entendeis tanto
quanto a criada de Dária Aleksiéievna que se foi queixar ao juiz do noivo! Ela
entenderia melhor do que vós.
- E que tem de mais que entendesse?! Muito provavelmente! Uma rapariga
respeitável que trabalha para viver! Por que se refere com tamanho desprezo a
uma empregada doméstica?
- Não sinto desprezo pelo trabalho, e sim por vós, quando falais de trabalho!
- Se quisesse ser respeitável tinha de começar por se tornar primeiro uma
lavadeira!
Ambas se ergueram e se olharam, lívidas.
- Agláia, pare; isso é injusto! - exclamou o príncipe, zonzo.
Rogójin já não sorria, mas estava escutando com os
lábios cerrados, de braços cruzados.
- Vede! Olhai-a! - disse Nastássia Filíppovna, fremindo de cólera. - Olhai essa
jovem! E eu que a tomava por um anjo! Vieste à minha casa, tu, Agláia
Ivánovna, sem trazeres uma governanta? Bem, já que assim preferes.., vou
dizer-te imediatamente, e em cheio, por que me vieste ver. Tinhas medo, eis por
que vieste.
- Medo de ti? - perguntou Agláia, fora de si, com uma admiração ingénua,
insultada por aquela mulher lhe ousar falar desta forma.
- De mim, sim..,
naturalmente que de mim! Tiveste medo. Se resolveste vir aqui, é que tinhas
medo de mim.
Não desprezamos aqueles dos quais temos medo. E dizer-se que respeitei isso que
está aí, até este momento! Mas queres saber o teu medo qual é e qual o teu fim, o
teu propósito principal agora, nisto tudo? Queres descobrir tu
mesma, se ele te ama mais do que a mim ... Não passas de uma terrível
ciumenta!...
- Ele já me disse que te odeia! - murmurou Agláia.
- Talvez, decerto mesmo, não
o mereço... mas penso que estás mentindo! Ele não me pode odiar! Ele não pode
ter dito isso! Mas estou pronta a perdoar-te, tendo em vista a posição em que te
achas... embora eu esperasse poder pensar melhor a teu respeito. Pensei que
fosses mais esperta e bem mais bonita, cheguei a pensar mesmo Está bem, toma
o teu tesouro!... Aqui está ele, até está te olhando, está deslumbrado! Toma-o,
mas com a condição de deixares esta casa imediatamente! Já, neste minuto!
Atirou-se em uma poltrona e caiu em pranto. Pouco depois. Porém, ergueu um
rosto que se iluminava com um sentimento novo. Olhou com decisão para
Agláia, fixou-a bem e se levantou.
- Mas, se duvidas, eu falarei com ele... Basta
que eu ordene, estás ouvindo bem? Basta uma palavra minha, e ele te
arremessará para longe, imediatamente! E ficará comigo! E casará comigo, ao
passo que tu terás de correr para tua casa, escorraçada e sozinha. Devo fazê-lo?
Devo? - gritou, como louca, sem saber que era capaz de dizer tal coisa.
Agláia correu aterrorizada para a porta, mas parou, porque ela continuava a
falar.
- Quer que mande Rogójin embora? Achavas, então, que eu ia me casar com
Rogójin só para te ser agradável! Pois aqui, na tua presença, vou gritar para
Rogójin: “Vai embora!” e vou dizer ao príncipe: “Lembras-te do que me
disseste?” Céus, por que me humilhei diante deles? Disseste-me, ou não, príncipe,
que me seguirias acontecesse o que acontecesse, que não me abandonarias
nunca, e que me amavas.., e que me perdoavas tudo... e que me resp... e... quê?...
Sim! Isto também tu disseste! E foi para te deixar livre que fugi aquela vez! Mas
agora não fugirei, não! Pergunta, vamos, pergunta a Rogójin, se eu sou uma
mulher perdida! Ele o dirá! E agora, que ela me cobriu de vergonha, diante de
teus olhos, arredar-te-ás de mim e te retirarás de braço com ela? Bem, então, se
tu também maldito, pois eras a única pessoa no mundo em quem eu confiava!
Sem saber direito o que estava dizendo, soltando as palavras com esforço, o rosto
convulso, os lábios repuxados, disse mais alto ainda:
- Vai-te embora. Rogójin!
Não és preciso para nada!
Evidentemente não acreditava em uma sílaba da sua
tétrica eloquência, e ao mesmo tempo desejava prolongar essa situação, por um
minuto mais que
fosse para iludir-se. O sofrimento foi tanto, que a poderia ter matado (como,
pelo menos, pensou o príncipe).
- Aqui está ele. Olha-o! - gritou para Agláia apontando para Míchkin. - Se não
vier para mim, imediatamente, se não me tomar, se não desistir de ti, toma- o tu,
eu to dou, não o quero!
Mas ela e Agláia ficaram, nisto, em suspenso, e ambas, como criaturas loucas,
olharam para o príncipe. Ele, decerto, não entendeis toda a força deste desafio.
De fato! É certo que não entendeu.! Apenas via, diante de si, a frenética e
desesperada face que (como uma vez dissera a Agláia) “tinha apunhalado o seu
coração para sempre”.
E vendo, não pôde suportar mais e se voltou suplicando e repreendendo Agláia,
mostrando-lhe Nastássia Filíppovna: “Como podeis...? Não vêdes, então, que
criatura infeliz ela é?”
E não pôde pronunciar mais nada, petrificada pela terrível expressão dos olhos de
Agláia. Esse olhar traía tamanho sofrimento, e ao mesmo tempo tão
desmesurada cólera que, com um gesto de desespero, correu para ela... Mas era
muito tarde. Ela não pudera suportar o instante sequer da sua hesitação. Escondeu
o rosto nas mãos, gritou “Ó meu Deus!”, descobriu o rosto e saiu a correr da sala,
seguida por Rogójin que foi desaferrolhar a porta. O príncipe instantaneamente
correu também, mas já na porta se sentiu agarrado por dois braços, diante do
umbral. Diante do seu, se estampava, convulso e desesperado, o rosto de
Nastássia Fillíppovna que de modo lancinante lhe disse:
- Tu a segues? A ela?
E caiu sem sentidos em seus braços. Susteve-a, carregou-a para a sala, depô-la
em um canapé, e ficou ali, em pé, marasmado. Havia um copo com um resto de
água sobre a mesinha ao lado. Aproximando-se, vindo da porta, Rogójin
aspergiu-o sobre o rosto dela. Abrindo, um minuto depois, os olhos, durante outro
minuto não se lembrou de nada; mas, subitamente, volveu os olhos em redor,
tentou erguer-se, arremessou-se aos braços do príncipe, gritando:
- Meu! És meu!... A jovem orgulhosa já foi embora? Ah! Ah! Ah! - parecia uma
histérica em paroxismo. - Ah! Ah! Ah! Eu te ofereci àquela jovem louca! E por
quê? Para quê? Eu estava fora de mim! Vá-se embora, Rogójin! Ah! Ah! Ah!...
Rogójin olhou-os; não disse palavra. Tomou o chapéu e saiu. Dez minutos depois
o príncipe estava sentado ao lado de Nastássia Fílíppovna, com os olhos postos
nela, acariciando-lhe o rosto e os cabelos com
ambas as mãos, como se ela fosse uma criancinha. Suspirava em resposta às
suas risadas e chorava em resposta às suas lágrimas. Não dizia nada. Só lhe
escutava o balbucio entrecortado, incoerente e excitado. Não compreendia quase
nada do que ela balbuciava, mas lhe sorria meigamente e logo que percebia que
recomeçava a afligir-se, a chorar, a queixar-se dele, a lastimar-se, principiava
de novo a acariciar-lhe a cabeça, desde os cabelos até ao queixo, acalmando-a,
consolando-a como a uma criancinha.
continua página 517...
_____________________
Leia também:
_____________________
Leia também:
Segunda Parte
Terceira Parte
O Idiota: Quarta Parte (8c) - Ela também estava vestida
___________________
___________________
Nenhum comentário:
Postar um comentário