sexta-feira, 8 de setembro de 2023

Sarau... Mulheres: A moça da cicatriz no queixo 4 e 5 (Eduardo Galeano)

Mulheres




Eduardo Galeano


021.


A MOÇA DA CICATRIZ NO QUEIXO


4

O céu amanheceu limpo e azul. 

Ao entardecer, vimos ao longe os barcos dos pescadores como pontinhos que vinham crescendo. Voltavam com os porões repletos de tubarões.

Eu conhecia essa horrível agonia. Os tubarões, estrangulados, remexiam-se nas redes, tentando cegamente lançar mordidas antes de caírem amontoados. 



5


– Aqui ninguém encontrará você. Fica, até que as coisas mudem. 

– As coisas mudam sozinhas? 

– O que você vai fazer? A revolução? 

– Eu sou uma formiguinha. As formiguinhas não fazem coisas tão grandes como a revolução ou a guerra. Levamos pedacinhos de folhas ou mensagens. Ajudamos um pouco. 

– Folhinhas, pode ser. Ficaram algumas plantas. 

– E algumas pessoas. 

– Sim: os velhos, os milicos, os presos e os loucos. 

– Não é bem assim

– Você não quer que seja bem assim. 

– Estive muito tempo fora. Longe. E agora... agora estou quase de volta. Pertinho, em frente. Sabe o que sinto? O que os bebezinhos sentem quando observam o dedão do pé e descobrem o mundo. 

– A realidade não se importa nem um pouco com o que você sente. 

– E vamos ficar chorando pelos cantos? 

– Seis vezes sete é quarenta e dois e não noventa e quatro, e você, furiosa grita: Quem é o filho da puta que anda mudando os números? 

– Mas... você pode me dizer como é que se acaba com uma ditadura? Com flechinhas de papel? 

– Com o quê, eu não sei. 

– Daqui, se acaba uma ditadura? Por controle remoto? 

– Ah, sim. A heroína solitária busca a morte. Não, não é machismo pequeno-burguês. É feminismo. 

– E você? Pior. É egoísmo. 

– Ou covardia. Diga. 

– Não, não. 

– Diga que sou enganador, desertor. 

– Você não entendeu. 

– É você quem não entende. 

– Por que reage assim? 

– E você?

– Eu já sei que você não precisa provar nada a você mesmo. Não seja bobo. 

– No entanto, você me disse que... 

– E você também me disse. Vamos começar outra vez? 

– Está bem. Eu me expressei mal. 

– Desculpe-me. 

– Seria uma estupidez discutirmos nestes poucos dias que... 

– Sim. Nestes poucos dias. 

– Escuta. 

– O quê? 

– Sabe de uma coisa? Estamos todos desamparados. 

– Sim. 

– Todos. Desamparados. 

– Sim. Mas eu te amo. 

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Galeano, Eduardo, 1940-
Mulheres / Eduardo Galeano; tradução de Eric Nepomuceno.
1. Ficção uruguaia- Crônicas. I. Título. II. Série.
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Sarau... Mulheres: A moça da cicatriz no queixo 4 e 5

pag 029...



Louise

—Quiero saber lo que saben —explicó ella. 

Sus compañeros de destierro le advirtieron que esos salvajes no sabían nada más que comer carne humana:

—No saldrás viva.

Pero Louise Michel aprendió la lengua de los nativos de Nueva Caledonia y se metió en la selva y salió viva.

Ellos le contaron sus tristezas y le preguntaron por qué la habían mandado allí: 

—¿Mataste a tu marido?

Y ella les contó todo lo de la Comuna:

—Ah —le dijeron—. Eres una vencida. Como nosotros. 

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