Moby Dick
Herman Melville32 - Cetologia
continuando...
I. A BALEIA IN-FÓLIO; II. A BALEIA IN-OCTAVO; III. A BALEIA IN-DUODECIMO.
Como tipo do IN-FÓLIO apresento o Cachalote; do IN-OCTAVO, a Orca; do IN-DUODE
CIMO, a Marsopa.
IN-FÓLIOS. Nestes incluo os seguintes capítulos: – I. O Cachalote; II. A Baleia Franca;
III. A Baleia de barbatana dorsal; IV. A Baleia Corcunda; V. A Baleia dorso-de
navalha; VI. A Baleia Barriga-de-enxofre.
LIVRO I. (In-fólio), CAPÍTULO I. (Cachalote). – Esta baleia entre os antigos Ingleses
era vagamente conhecida como baleia Trumpa, baleia Physeter, baleia Anvil
Headed; é o atual Cachalot dos Franceses, o Pottfisch dos Alemães e o
Macrocephalus dos Palavras Longas. Sem dúvida nenhuma, é o maior habitante
do globo; a baleia mais formidável de se encontrar; a de aspecto mais majestoso;
e, por fim, é de longe a mais valiosa para o comércio; é a única criatura da qual
aquela valiosa substância, o espermacete, é extraída. Em muitos outros lugares
irei discorrer mais longamente sobre todas as suas particularidades. É
principalmente de seu nome que vou tratar agora [Sperm Whale]. Considerado do
ponto de vista da Filologia, é um absurdo. Há alguns séculos, quando o cachalote
era quase totalmente desconhecido em sua própria individualidade e quando seu
óleo era acidentalmente obtido dos peixes que ficavam encalhados, parece que
naquele tempo se achava que o espermacete era tirado de uma criatura idêntica
àquela conhecida na Inglaterra como baleia da Groenlândia ou baleia franca.
Pensava-se mesmo que o espermacete era o fluido fecundante da baleia da
Groenlândia, que está expresso literalmente na palavra. Naquele tempo também,
o espermacete era muito raro, não sendo usado para iluminação, mas apenas
como unguento ou medicamento. Só se podia obtê-lo de farmacêuticos, como
hoje você compra uma onça de ruibarbo. Julgo que, com o passar do tempo,
quando a verdadeira origem do espermacete se tornou conhecida, os
comerciantes mantiveram seu nome original; sem dúvida, para aumentar seu
valor, associando-o à ideia tão estranhamente significativa de raridade. Foi assim
que o nome deve ter sido dado à baleia da qual o espermacete realmente
provinha.
LIVRO I. (In-fólio), CAPÍTULO II. (Baleia Franca). – Sob determinado aspecto este é o
Leviatã mais venerável de todos, sendo o primeiro a ser regularmente pescado
pelo homem. Fornece o produto mais conhecido como “barba-de-baleia” ou
“barbatana”; e o óleo especialmente conhecido como “óleo de baleia”, um
produto inferior no comércio. Entre os pescadores, é designada
indiscriminadamente das seguintes formas: a Baleia; a Baleia da Groenlândia; a
Baleia Negra; a Grande Baleia; a Baleia Verdadeira; a Baleia Franca. Há muitos
pontos obscuros em relação à identidade dessa espécie tão diferentemente
batizada. Qual é então a baleia que eu incluo como a segunda espécie dos meus
fólios? É a Grande Mysticetus dos naturalistas Ingleses; a Baleia da Groenlândia
dos baleeiros Ingleses; a Baleia Ordinaire dos baleeiros Franceses, ou a Gronlands
Walfisk dos Suecos? É a baleia que há mais de dois séculos é pescada pelo
Holandês e pelo Inglês nos mares Árticos; é a baleia que há muito os pescadores
norte-americanos perseguiram no oceano Índico, nas Encostas do Brasil, na Costa
noroeste, e em várias outras partes do mundo, chamadas por eles de Regiões de
Pesca da Baleia Verdadeira.
Alguns pretendem ver uma diferença entre a baleia da Groenlândia do Inglês e
a baleia franca dos norte-americanos. Mas concordam exatamente quanto às
características principais; também nunca apresentaram um único fato
determinante que justificasse uma distinção tão radical. Deve-se às subdivisões
intermináveis baseadas em diferenças inconclusivas que algumas áreas da
História Natural se tornem tão repulsivamente complexas. A baleia franca será
tratada minuciosamente mais adiante, com o objetivo de esclarecer a natureza do
cachalote.
LIVRO I. (In-fólio), CAPÍTULO III. (Baleia de barbatana dorsal). – Sob este título
coloco um monstro que, com diferentes nomes, Dorso-de-barbatana, Jato alto e
João comprido, foi visto em quase todos os oceanos; é comumente a baleia cujo
jato, a distância, foi tantas vezes descrito por passageiros que atravessavam o
Atlântico, na rota dos vapores de Nova York. Pelo comprimento que alcança, e
por suas barbas, a baleia de barbatana dorsal se assemelha à baleia franca, mas
tem uma medida de cintura menor e uma cor mais clara, próxima do azeitonado.
Seus grandes lábios apresentam o aspecto de cabo, formados pelas dobras
entrelaçadas e oblíquas de enormes rugas. O principal traço que a distingue, a
barbatana, que dá origem ao seu nome, é frequentemente um objeto notável.
Essa barbatana possui uns três ou quatro pés de comprimento e cresce
verticalmente na parte posterior das costas, com um formato angular e uma
ponta muito aguda. Mesmo quando nem a menor parte dessa criatura é visível, a
barbatana pode, às vezes, ser distintamente vista projetando-se à superfície.
Quando o mar está moderadamente calmo, ligeiramente marcado por
ondulações, e essa barbatana gnomônica se ergue e lança sombras na superfície
enrugada, pode-se imaginar que o círculo de água ao seu redor lembra um
relógio de sol, com o ponteiro e as marcas de horas gravadas nele. Nesse relógio
de sol de Ahaz, a sombra frequentemente se retrai. A baleia de barbatana dorsal
não é gregária. Parece que odeia baleias, como certos homens odeiam homens.
Muito tímida; sempre sozinha; surgindo inesperadamente na superfície das águas
mais remotas e sombrias; erguendo seu jato vertical, alto e único como uma
comprida lança misantrópica em terras áridas; dotada de poderes tão
maravilhosos e de tanta velocidade no nado, que é como se desafiasse toda a
atual perseguição do homem; esse Leviatã parece ser, banido e inconquistável, o
Caim de sua raça, trazendo o estigma desse estilete nas costas. Por ter a barba na
boca, a baleia de barbatana dorsal é às vezes incluída juntamente com a baleia
franca numa espécie em teoria chamada de baleias de Barba, ou seja, baleias com
barbatanas na boca. Dessas chamadas baleias de Barba parece haver diversas
variedades, mas que são pouco conhecidas. Baleias de focinho largo e baleias de
bico; baleias de cabeça de lança; baleias de bando; baleias de queixada e baleias
narigudas são alguns nomes que os pescadores lhes dão.
Em relação a esta expressão “baleias de Barba”, é importante mencionar que,
muito embora tal nomenclatura possa servir para facilitar as referências a um
certo tipo de baleias, é contudo inútil tentar uma classificação coerente do Leviatã
baseando-se em sua barba, ou corcova, ou barbatana, ou dentes; ainda que essas
partes ou características sejam aparentemente mais propícias para fornecer a base
de um sistema regular para a Cetologia do que quaisquer outras particularidades
físicas que cada tipo de baleia apresente. E agora? A barba, a corcova, a barbatana
dorsal e os dentes; essas são coisas cujas particularidades estão
indiscriminadamente dispersas por todos os tipos de baleias, sem qualquer
relação com o que pode ser a natureza de sua estrutura em outras e mais
essenciais particularidades. Desse modo, tanto o cachalote quanto a baleia
corcunda têm uma corcova; mas a semelhança cessa aí. A mesma baleia
corcunda e a baleia da Groenlândia têm barbas, mas a semelhança também cessa
aí. O mesmo ocorre com as outras partes acima mencionadas. Em vários tipos de
baleias essas partes formam combinações muito irregulares; ou, no caso de se dar
destaque a qualquer uma dessas baleias, o que existe é um isolamento irregular,
como se, por fim, se desafiasse todo o método geral criado a partir dessa base.
Nesta rocha, todos os naturalistas de baleias encalharam.
Mas pode-se pensar que nas partes internas da baleia, em sua anatomia – ali,
ao fim e ao cabo, será possível encontrar uma classificação acertada. Engano: o
que há de mais notável na anatomia da baleia da Groenlândia do que sua barba?
Já vimos que por sua barba é impossível classificar corretamente a baleia da
Groenlândia. E se você descer às entranhas dos diferentes Leviatãs, não encontrará
ali a quinquagésima parte das diferenças externas já enumeradas. O que resta,
então? Nada além de considerar as baleias em seu conjunto, em todo seu enorme
volume, e, com ousadia, classificá-las a partir dessa base. E esse é o sistema
bibliográfico adotado aqui; e é o único que pode dar certo, pois é o único
praticável. Continuemos.
LIVRO I. (In-fólio), CAPÍTULO IV. (Baleia corcunda). – Esta baleia é vista com
frequência na costa setentrional dos Estados Unidos, onde é capturada e rebocada
para o porto. Tem no dorso um grande pacote, como um mascate. Pode-se
chamá-la de baleia Elefante ou Castelo. De qualquer maneira, seu nome mais
conhecido não a diferencia das outras, porque o cachalote também tem uma
corcova, embora menor. Seu óleo não tem muito valor. Tem nadadeiras. É a mais
brincalhona e feliz de todas as baleias, formando mais da alegre espuma e
espalhando mais água do que qualquer outra.
LIVRO I. (In-fólio), CAPÍTULO V. (Baleia dorso-de-navalha). – Pouco se sabe a respeito
desta baleia além de seu nome. Eu a vi a distância ao largo do cabo Horn.
Recolhida por natureza, evita tanto os pescadores quanto os filósofos. Embora não
seja covarde, nunca mostra nada de seu corpo além do dorso, quando se ergue
numa escarpa afiada. Deixe que se vá. Não sei muito mais sobre ela, nem
ninguém sabe além disso.
LIVRO I. (In-fólio), CAPÍTULO VI. (Baleia barriga-de-enxofre). – Outra baleia esquiva,
com uma barriga cor de enxofre, sem dúvida adquirida ao roçar-se nas telhas do
Tártaro, quando dos mergulhos mais profundos. Raras vezes é vista; pelo menos
nunca a vi exceto nos mais ermos Mares do Sul, e sempre tão ao longe, que mal
podia divisar seu semblante. Nunca é caçada, porque fugiria com todas as
reservas de cordas. Sobre ela, contam-se maravilhas. Adeus, barriga-de-enxofre!
Nada mais posso contar que seja verdadeiro sobre ti, e nem tampouco o poderia o
homem mais velho de Nantucket.
Assim termina o LIVRO I. (In-fólio).
Continua na página 137...
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Leia também:
Moby Dick: Etimologia, Excertos, Citações
Moby Dick: 1 - Miragens
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Moby Dick: 1 - Miragens
Moby Dick: 32 - Cetologia (b)
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O romance foi inspirado no naufrágio do navio Essex, comandado pelo capitão George Pollard, que perseguiu teimosamente uma baleia e ao tentar destruí-la, afundou. Outra fonte de inspiração foi o cachalote albino Mocha Dick, supostamente morta na década de 1830 ao largo da ilha chilena de Mocha, que se defendia dos navios que a perturbavam.
A obra foi inicialmente mal recebida pelos críticos, assim como pelo público por ser a visão unicamente destrutiva do ser humano contra os seres marinhos. O sabor da amarga aventura e o quanto o homem pode ser mortal por razões tolas como o instinto animal, sendo capaz de criar seus fantasmas justamente por sua pretensão e soberba, pode valer a leitura.
Moby Dick é um romance do escritor estadunidense Herman Melville, sobre um cachalote (grande animal marinho) de cor branca que foi perseguido, e mesmo ferido várias vezes por baleeiros, conseguiu se defender e destruí-los, nas aventuras narradas pelo marinheiro Ishmael junto com o Capitão Ahab e o primeiro imediato Starbuck a bordo do baleeiro Pequod. Originalmente foi publicado em três fascículos com o título "Moby-Dick, A Baleia" em Londres e em Nova York em 1851,
O livro foi revolucionário para a época, com descrições intrincadas e imaginativas do personagem-narrador, suas reflexões pessoais e grandes trechos de não-ficção, sobre variados assuntos, como baleias, métodos de caça a elas, arpões, a cor do animal, detalhes sobre as embarcações, funcionamentos e armazenamento de produtos extraídos das baleias.O romance foi inspirado no naufrágio do navio Essex, comandado pelo capitão George Pollard, que perseguiu teimosamente uma baleia e ao tentar destruí-la, afundou. Outra fonte de inspiração foi o cachalote albino Mocha Dick, supostamente morta na década de 1830 ao largo da ilha chilena de Mocha, que se defendia dos navios que a perturbavam.
A obra foi inicialmente mal recebida pelos críticos, assim como pelo público por ser a visão unicamente destrutiva do ser humano contra os seres marinhos. O sabor da amarga aventura e o quanto o homem pode ser mortal por razões tolas como o instinto animal, sendo capaz de criar seus fantasmas justamente por sua pretensão e soberba, pode valer a leitura.
E você com o quê se identifica?
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