Germinal
Émile Zola
Tradução de Francisco Bittencourt
Tradução de Francisco Bittencourt
Terceira Parte
II
continuando...Quando os três chegavam ao café Piquette, um ruído de briga fez que parassem à porta. Era Zacharie, que ameaçava com o punho um vendedor de pregos belga, atarracado e fleumático. Por sua vez, Chaval, mãos nos bolsos, observava.
— Vejam, lá está Chaval — falou tranquilamente Maheu. —
Catherine também.
Havia cinco horas que a operadora de vagonetes e o namorado
passeavam pela festa do padroeiro da cidade. Ao longo da estrada de
Montsou, dessa rua larga de casas baixas pintadas de cores berrantes,
descendo em ziguezague, havia uma multidão locomovendo-se ao sol, igual
a um carreiro de formigas perdido na nudez da planície rasa. A eterna lama
negra tinha secado; subia uma poeira preta que pairava como uma nuvem
de tempestade. Dos dois lados, as tabernas estavam apinhadas de gente, e
tinham de colocar suas mesas até na calçada, onde estacionava uma dupla
fileira
de vendedores ambulantes, verdadeiros bazares ambulantes
vendendo lenços e espelhos para as moças, facas e bonés para os rapazes,
sem contar as guloseimas, confeitos e biscoitos. Em frente à igreja atirava
se ao alvo com arco e flecha; diante dos depósitos da companhia havia
jogos de bola. Num desvio da estrada de Joiselle, ao lado da administração,
um cercado de tábuas burburinhava com a multidão que assistia a uma briga
de galos, onde dois enormes galos vermelhos, armados de esporões de
ferro, sangravam pelo pescoço. Mais adiante, no estabelecimento de
Maigrat, ganhavam-se aventais e calças no jogo de bilhar. E havia silêncios
espaçados, a turba bebia, empanturrava-se sem um grito, a muda indigestão
de cerveja e batatas fritas era cada vez maior sob o calor intenso, que as
frigideiras a borbulhar ao ar livre tornavam ainda mais abrasador.
Chaval comprou um espelho de dezenove soldos e um lenço de
pescoço de três francos para Catherine. A cada volta encontravam Mouque
e Boa-Morte, que tinham vindo à festa e a atravessavam juntos, com suas
pernas cansadas e vagarosas. Um outro encontro, porém, indignou-os:
perceberam Jeanlin incitando Bébert e Lydie a furtarem garrafas de genebra
de uma tenda instalada num terreno baldio. Catherine conseguiu dar uns
tapas no irmão, mas Lydie já escapara com uma garrafa. Ah, essas crianças
estavam perdidas, acabariam nas galés!
Ao passarem em frente à venda Tête Coupée, Chaval teve a idéia de
entrar com a sua namorada para assistir a um torneio de pintassilgos verdes
que um cartaz na porta anunciava, havia oito dias. Quinze pregueiros, das
fábricas de pregos de Marchiennes, concorriam, cada um com uma dúzia de
gaiolas. Essas pequenas gaiolas cobertas, onde os pintassilgos sem visão
permaneciam imóveis, já estavam penduradas numa cerca de madeira no
pátio da taberna. Tratava-se de contar qual deles, durante uma hora,
repetiria mais vezes o trinado do seu canto. Cada pregueiro, com uma
ardósia, permanecia por trás das suas gaiolas, vigiando seus vizinhos e
sendo por eles vigiado. E os pintassilgos começaram, uns gravemente,
outros com uma sonoridade aguda, a princípio tímidos, soltando um ou
outro gorjeio; depois, excitados pelos outros, apressaram o ritmo, e enfim,
arrebatados por tal fúria de competição, alguns chegaram a cair mortos.
Violentamente, os pregueiros os açulavam com a voz, gritavam-lhes em
flamengo que cantassem mais, mais, um pouquinho mais, enquanto os
espectadores, umas cem pessoas, permaneciam mudos, siderados no meio
daquela música infernal de cento e oitenta pintassilgos repetindo a mesma
cadência em desacordo. Foi um pássaro de trinado agudo que ganhou o
primeiro prêmio, uma cafeteira de ferro batido.
Catherine e Chaval já estavam lá quando entrou Zacharie
acompanhado de Philomène. Trocaram apertos de mão e ficaram juntos.
Repentinamente Zacharie teve uma explosão ao surpreender um pregueiro,
que ali entrara por curiosidade com outros companheiros, tateando as
pernas da irmã. Ela, muito vermelha, pedia-lhe que se calasse, apavorada
com a ideia de uma mortandade, com todos aqueles pregueiros atirando-se
sobre Chaval se este resolvesse criar caso. Ela já sentira o homem a apalpá-la, mas não dissera nada por prudência. Mas seu namorado não levou a
coisa a sério, os quatro saíram e o assunto pareceu encerrado. Apenas,
porém, tinham entrado no Piquette para beber uma cerveja e eis que o
pregueiro apareceu, debochando deles, resfolegando nas suas caras,
provocando. Zacharie, sentindo ultrajada a dignidade familiar, atirou-se
sobre o insolente.
— Esta é a minha irmã, seu cachorro! Espera que já faço com que a
respeites!
Precipitaram-se para apartar os dois homens, enquanto Chaval,
muito calmo, repetia:
— Deixa para lá, isso é comigo... Mas o melhor é não lhe dar a
mínima importância...
Maheu vinha chegando com os companheiros e logo foi acalmar
Catherine e Philomène, que choravam. A animação já voltara, o pregueiro
tinha desaparecido. Para pôr um ponto final no incidente, Chaval, que se
sentia em casa no café Piquette, ofereceu cerveja. Etienne teve de brincar
com Catherine, todos beberam juntos, o pai, a filha e o amante, o filho e a
amante, dizendo polidamente: "À saúde de todos!" Em seguida foi Pierron
quem insistiu em pagar uma rodada. Todo mundo já estava de acordo e
feliz, quando Zacharie se enfureceu de novo ao avistar seu amigo Mouque.
Chamou-o, para irem juntos, dizia ele, ajustar as contas com o pregueiro.
— Tenho ganas de amassá-lo! Chaval, toma conta de Philomène e
Catherine, volto logo.
Agora era a vez de Maheu oferecer cerveja. Afinal, se o rapaz
queria vingar a irmã, não podia proibi-lo. Philomène, no entanto, ao ver que
o amante saía com o filho de Mouque, balançou a cabeça tranquilizada.
Claro, os dois malandros tinham ido para o Volcan.
Nessas festas, concluía-se o dia no baile do Bon-Joyeux. Era a
viúva Désir que organizava esse baile. Désir tinha cinqüenta anos, vigorosa
e rotunda como um tonei, com energia suficiente para dar prazer a seis
amantes; recebia um por dia durante a semana e, dizia ela, todos juntos no
domingo. Chamava os mineiros de seus filhos, enternecida com a visão do
rio de cerveja com que os inundava havia trinta anos; e gabava-se ainda de
que nenhuma operadora de vagonetes ficava grávida sem ter, antes, dançado
na sua casa. O Bon-Joyeux compunha-se de duas salas: a taberna, onde
havia o balcão e as mesas, e, no mesmo andar e ligado a ela por um enorme
arco, o salão de baile, peça muito ampla, com uma pista de madeira no meio
e chão de tijolo em volta. A decoração compunha-se de duas guirlandas de
flores de papel que se cruzavam de um ângulo a outro do teto, formando no
centro uma coroa; ao longo das paredes alinhavam-se brasões dourados
com nomes de santos: Santo Elói, padroeiro dos metalúrgicos, São Crispim,
dos sapateiros, Santa Bárbara, dos mineiros, todo o calendário festivo das
profissões. O teto era tão baixo que os três músicos, no seu estrado do
tamanho de um púlpito, batiam nele todo o tempo com a cabeça. À noite, a
iluminação era feita por quatro lampiões a querosene presos nos quatro
cantos do salão.
Naquele domingo, dançou-se a partir das cinco horas, ainda com sol
alto. Foi, no entanto, a partir das sete que a casa começou a encher. Lá fora
soprava um vento de tempestade, levantando ondas de poeira negra que
cegavam as pessoas e caíam como granizo dentro das frigideiras das tendas
que vendiam batata frita. Maheu, Etienne e Pierron, que tinham entrado
para descansar um pouco, encontraram no Bon-Joyeux Chaval dançando
com Catherine, enquanto Philomène, sozinha, observava. Levaque e
Zacharie ainda não tinham aparecido. Como não havia bancos no salão de
baile, Catherine, após cada dança, ia descansar na mesa do pai. Chamaram
Philomène, que disse preferir ficar em pé.
Anoitecia. Os três músicos tocavam sem parar; só se via na sala o
movimento dos quadris e dos seios no meio de uma confusão de braços.
Uma gritaria acolheu os quatro lampiões que, subitamente, iluminaram
tudo: as faces vermelhas, os cabelos em desalinho, colados à pele, as saias
no ar, expulsando o cheiro forte dos pares suados. Maheu mostrou a Etienne
a filha de Mouque, que, redonda e gorda como uma bexiga cheia de unto de
porco, rodopiava violentamente nos braços de um ascensorista alto e magro:
para se consolar, arranjara outro homem.
Eram oito horas quando finalmente surgiu a mulher de Maheu, com
Estelle ao colo, seguida do resto das crianças: Alzire, Henri e Lénore. Sabia
que seu homem estava ali, nunca se enganava. Ceariam mais tarde,
ninguém tinha fome, todos estavam com o estômago repleto de café e
inchado de cerveja. Outras mulheres chegavam. Houve cochichos quando,
atrás da mulher de Maheu, entrou a de Levaque, acompanhada de
Bouteloup, que trazia pela mão os filhos de Philomène, Achille e Désirée.
As duas vizinhas pareciam andar às mil maravilhas, voltavam-se todo o
tempo para trocar impressões. Pelo caminho tinham tido uma grande
conversa, a mãe de Zacharie resignara-se finalmente ao casamento do filho,
abatida por ter de perder o dinheiro que o rapaz lhe dava, mas vencida pela
razão: não podia conservá-lo por mais tempo sem cometer uma injustiça.
Tratava, agora, de manter as aparências, mas com o coração aos pulos, de
dona-de-casa que se perguntava ansiosamente como faria para manter o lar
provido quando os filhos começavam a abandoná-lo.
— Senta-te aí, vizinha — disse ela, apontando para uma mesa junto
daquela em que Maheu bebia com Etienne e Pierron.
— Meu marido não está com vocês? — perguntou a mulher de
Levaque.
Responderam-lhe que voltava. Estavam todos amontoados,
Bouteloup e as crianças ficaram espremidos entre os que bebiam as duas
mesas formavam uma só. Pediram cerveja. Vendo a mãe e os filhos,
Philomène aproximou-se. Aceitou uma cadeira e deu sinais de alegria
quando soube que finalmente ia casar. Depois como lhe perguntassem por
Zacharie, respondeu com sua voz fraca:
— Estou à espera dele, anda por aí.
Maheu trocou olhares com a mulher. Então ela consentia? Ficou
sério e pôs-se a fumar em silêncio. Ele também se inquietava com o dia de
amanhã, diante da ingratidão daqueles filhos que se casariam, um a um,
deixando os pais na miséria.
Continuavam a dançar. Um fim de quadrilha enchia a sala de poeira
vermelha, as paredes estalavam, um pistom dava assobios agudos, como
uma locomotiva descarrilada. Os dançarinos, quando pararam, mais
pareciam cavalos esfalfados, com o suor evaporando.
— Lembras — disse a mulher de Levaque ao ouvido da vizinha —
quando dizias que estrangularia Catherine se ela desse um mau passo?
Chaval trouxe Catherine para a mesa da família e ambos, em pé por
trás de Maheu, acabaram seus copos.
— Ah! — respondeu a outra. — A gente diz cada coisa... O que me
tranquiliza é que não pode ter filhos, disso estou certa. Imagina se ela
também resolvesse parir e eu fosse obrigada a casá-la! Como é que a gente
ia comer?
Agora era uma polca que o pistom tocava. Quando a barulheira
recomeçou, Maheu curvou-se para a mulher e cochichou-lhe uma ideia que
tivera. Por que não tomavam um inquilino, Etienne, por exemplo, que
queria sair da pensão? Teriam lugar com a saída de Zacharie e, assim, o
dinheiro que iam perder desse lado poderiam recuperá-lo, pelo menos em
parte, do outro. O semblante da mulher iluminou-se: claro, que boa ideia,
era preciso tratar disso! Parecia mais uma vez salva da fome, seu bom
humor era tanto que pediu mais uma rodada de cerveja.
Enquanto isso, Etienne tentava catequizar Pierron, explicando-lhe
seu projeto de uma caixa de previdência. Já conseguira que o outro
prometesse aderir, quando cometeu a imprudência de descobrir sua
verdadeira intenção.
— E, se entrarmos em greve, a utilidade dessa caixa será enorme.
Podemos enfrentar a companhia, porque teremos fundos para resistir. Hem?
Dás a palavra? Podemos contar contigo?
Pierron baixara os olhos, empalidecendo. Gaguejou:
— Vou refletir. O nosso bom comportamento é a melhor caixa de
socorro.
Nesse momento Maheu apoderou-se de Etienne e propôs-lhe tomá-lo como hóspede, com aquela maneira franca, de homem sincero, que era a
sua. O rapaz aceitou do mesmo modo, ansioso para ir morar no conjunto
habitacional e conviver mais largamente com os camaradas. O assunto ficou
resolvido com três palavras e a mulher de Maheu declarou que esperariam
pelo casamento dos filhos.
Justamente nessa ocasião entrou Zacharie, acompanhado do jovem
Mouque e de Levaque. Os três traziam o cheiro do Volcan, um hálito de
genebra, um azedume almiscarado de mulheres mal lavadas. Estavam muito
bêbados, satisfeitos com a aventura, cutucando-se e gracejando. Quando
soube que finalmente ia casar, Zacharie riu tanto que se engasgou. Com
toda a calma Philomène declarou que preferia vê-lo rindo a vê-lo chorando.
Como não havia mais cadeiras, Bouteloup cedeu a metade da sua a
Levaque. Este, subitamente enternecido por ver todos reunidos, em família,
pediu mais uma rodada de cerveja.
— Diabos! Não é sempre que a gente pode divertir-se! — berrou.
Permaneceram no baile até as dez horas. As mulheres continuavam
a chegar para arrastar de volta ao lar os seus homens. Grupos de crianças
vinham a reboque. As mães, sentindo-se à vontade, punham à mostra seios
compridos e louros como sacos de aveia, lambuzando de leite os bebês
rechonchudos. Os que já podiam andar, abarrotados de cerveja,
engatinhavam por baixo das mesas e urinavam na frente de todos. Era um
verdadeiro dilúvio de cerveja, os tonéis da viúva Désir esvaziados, a bebida
arredondando as panças, gotejando por todas as partes, pelo nariz, pelos
olhos e pelos outros orifícios. Já estavam tão cheios naquele amontoado,
que cada um tinha um ombro ou um joelho enterrado no vizinho, todos
alegres e expansivos por se sentirem juntos. Um gargalhar contínuo
mantinha as bocas abertas, rasgadas até as orelhas. O calor era de forno,
assava-se, todos se punham à vontade, expondo as carnes que pareciam
douradas devido à espessa fumaça dos cachimbos. O único inconveniente
eram as necessidades fisiológicas: de vez em quando, uma moça levantava
se, dirigia-se para o fundo e ali, perto da bomba, levantava as saias e depois
voltava. Sob as guirlandas de papel colorido, os dançarinos não se viam
mais de tanto que suavam, o que encorajava os meninos de catorze anos a
darem tombos nas operadoras de vagonetes com golpes de quadris
distribuídos ao acaso. Mas, quando uma delas caía com um homem por
cima, o pistom disfarçava a queda com o seu toque furioso, o movimento
dos pés dos outros fazia-os rolar pela pista, como se o salão tivesse
desabado sobre eles.
Alguém de passagem advertiu Pierron de que sua filha Lydie
dormia na porta, atravessada na calçada. A menina tinha bebido sua parte
da garrafa roubada e estava bêbada. O pai teve de carregá-la ao ombro,
enquanto Jeanlin e Bébert, ainda bons das pernas, seguiam-no a distância,
achando que era fingimento da companheira. Isso foi o sinal para a partida.
As famílias começaram a deixar o Bon-Joyeux; os Maheu e os Levaque
decidiram voltar para casa.
Nesse momento, Boa-Morte e Mouque deixavam Montsou, sempre
no mesmo passo sonâmbulo, obstinados no silêncio de suas recordações.
E assim voltaram todos juntos, atravessando por uma última vez o
local da festa, onde a gordura coalhava nas frigideiras e as últimas cervejas,
provindas das tabernas, corriam para o meio da estrada, formando regatos.
A tempestade podia desabar a qualquer momento. As risadas recomeçaram
assim que deixaram para trás as casas iluminadas e se embrenharam pelo
campo escuro. Um hálito ardente vinha dos trigais maduros, na certa muitas
crianças foram concebidas ali nessa noite... Chegaram ao conjunto
habitacional em grupos separados. Tanto os Levaque como os Maheu
comeram sem vontade; estes cabeceavam de sono sobre o cozido da manhã.
Etienne convidou Chaval para mais uma cerveja no Rasseneur.
— Estou contigo! — exclamou Chaval quando o companheiro lhe
explicou o plano da caixa de previdência. — Vamos, homem, faze isto
marchar! Tu és dos bons!
Um início de embriaguez fazia cintilar os olhos de Etienne. Gritou,
arrebatado:
— Sim, sejamos amigos! Vês? Eu pela justiça troco tudo, bebida e
mulheres. Só tenho uma idéia, um pensamento que faz pulsar meu coração:
unidos, destruiremos a burguesia.
continua na página 132...
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Terceira Parte - (II.b) Quando os três chegavam ao café
Terceira Parte - (III.a) Em meados de agosto
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O pai de Zola tinha 44 anos quando conheceu Émilie-Aurélie Aubert, numa de suas viagens a Paris. Apesar da grande diferença de idade — a moça não chegara aos vinte anos —, acabaram casando — se. O resultado dessa união foi Émile Zola, nascido em 12 de abril de 1840, durante uma estada do casal em Paris. O menino mal conheceu o pai: em 1847, François faleceu.
As coisas ficaram difíceis. Sozinha e com grandes esforços, a mãe procurou equilibrar o orçamento doméstico e fazer que o filho estudasse. De certa forma, ela teve sucesso: Zola foi aluno do Colégio Notre-Dame e do Colégio de Aix. Quando o rapaz atingiu a maioridade, partiu com Émilie para Paris e, graças a um amigo da família, conseguiu um emprego na Alfândega.
Em dezembro de 1859, concluía sua primeira obra em prosa, Les Grisettes de Provence (As Costureirinhas de Provença). Continuava, porém, desconhecido e insatisfeito. Ele mesmo costumava dizer: "Ser sempre desconhecido é chegar a duvidar de si; nada engrandece os pensamentos de um autor como o sucesso".
Assim, no início de 1866, deixou o emprego para dedicar-se à literatura.
Abandonou o romantismo de seus anos de adolescência e passou a admirar outros autores: Balzac (1799-1850), Stendhal (1783-1842), Flaubert (1821-1880). Essa guinada para o realismo devia-se principalmente às suas últimas leituras: das teorias evolucionistas de Darwin (1809-1882) até o Tratado da Hereditariedade Natural do Dr. Lucas, passando pela Filosofia da Arte de Taine (1328-1893). No entanto, o que parece tê-lo feito decidir-se pelo realismo foi a Introdução ao Estudo da Medicina Experimental (1865), de Claude Bernard (1813-1878). Essa obra foi importante para o rumo que Zola imprimiria a toda a sua obra: o rigor científico no romance, cujo objetivo, diria ele, é o mesmo das experiências de laboratório, isto é, o conhecimento da realidade. O que Claude Bernard havia feito com o corpo humano Zola faria com as paixões e os meios sociais.
Para fazer Germinal, Zola não se satisfez com a simples busca de documentos. Foi passar alguns meses numa região mineira. Morou em cortiços, bebeu cerveja e genebra nos botequins e desceu ao fundo dos poços para observar de perto o trabalho dos operários. Aos poucos foi se familiarizando com o meio onde viviam aqueles homens. Descobriu quais as principais doenças causadas pela mineração. Sentiu o problema dos baixos salários, os sacrifícios dos mineiros, a gota que cai com uma regularidade incrível sobre seus rostos, a dificuldade de empurrar um vagonete por um corredor estreito, o drama do salto na escuridão que eles têm de dar para poderem sobreviver. Numa passagem admirável, descreve a emoção de uma greve de operários. Mostra seu ódio animal. Um ódio que destrói tudo à sua passagem. Uma violência viva nos corpos que querem libertar-se, mesmo à custa da total destruição. Mostra também o amor feito sobre o carvão, os pequenos dramas das dívidas, as brigas no cortiço, a promiscuidade de pais e filhos em casas muito pequenas. A obra obteve enorme repercussão.
Em 29 de setembro de 1901, em Paris, Émile Zola morre asfixiado pelo gás do aquecedor.
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