Elias Canetti
OS MONTES DE PEDRA
Contudo, há também montes inteiramente diversos, não comestíveis. Os montes de pedra são erigidos porque é difícil desfazê-los. São erigidos para que durem muito tempo, uma espécie de eternidade. Eles não devem sofrer diminuição alguma, mas permanecer como são. Não se transferem para um estômago qualquer, e nem sempre se mora neles. Em sua forma mais antiga, cada pedra representa o homem que contribuiu para juntá-la ao amontoado. Posteriormente, o tamanho e o peso das partes aumenta, de modo que somente a reunião de muitos é capaz de dar conta de cada uma delas. O que quer que tais montes representem, eles contêm em si o esforço concentrado de árduos e incontáveis caminhos percorridos. É amiúde enigmático de que forma se logrou construí-los. Quanto menos se compreende a sua presença, quanto mais distante o local de origem da pedra e mais longos os caminhos, tanto maior o número de homens que se há de imaginar como seus construtores, e tanto mais vigorosa a impressão que causarão nos pósteros. Tais montes de pedra representam o esforço rítmico de muitas pessoas, um esforço do qual nada mais permanece senão esse monumento indestrutível.
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Copyright @ 1960 by Claassen Verlag GmbH, Hamburg
Copyright @ 1992 by Claassen Verlag GmbH, Hildescheim
Título original Masse und Macht
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Leia também:
Massa e Poder - Os Montes de Pedra
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ELIAS CANETTI nasceu em 1905 em Ruschuk, na Bulgária, filho de judeus sefardins. Sua família estabeleceu-se na Inglaterra em 1911 e em Viena em 1913. Aí ele obteve, em 1929, um doutorado em química. Em 1938, fugindo do nazismo, trocou Viena por Londres e Zurique. Recebeu em 1972 o prêmio Büchner, em 1975 o prêmio Nelly-Sachs, em 1977 o prêmio Gottfried-Keller e, em 1981, o prêmio Nobel de literatura. Morreu em Zurique, em 1994.
Além da trilogia autobiográfica composta por A língua absolvida (em A língua absolvida Elias Canetti, Prêmio Nobel de Literatura de 1981, narra sua infância e adolescência na Bulgária, seu país de origem, e em outros países da Europa para onde foi obrigado a se deslocar, seja por razões familiares, seja pelas vicissitudes da Primeira Guerra Mundial. No entanto, mais do que um simples livro de memórias, A língua absolvida é a descrição do descobrimento do mundo, através da linguagem e da literatura, por um dos maiores escritores contemporâneos), Uma luz em meu ouvido (mas talvez seja na autobiografia que seu gênio se evidencie com maior clareza. Com este segundo volume, Uma luz em meu ouvido, Canetti nos oferece um retrato espantosamente rico de Viena e Berlim nos anos 20, do qual fazem parte não só familiares do escritor, como sua mãe ou sua primeira mulher, Veza, mas também personagens famosos como Karl Kraus, Bertolt Brecht, Geoge Grosz e Isaak Babel, além da multidão de desconhecidos que povoam toda metrópole) e O jogo dos olhos (em O jogo dos olhos, Elias Canetti aborda o período de sua vida em que assistiu à ascensão de Hitler e à Guerra Civil espanhola, à fama literária de Musil e Joyce e à gestação de suas próprias obras-primas, Auto de fé e Massa e poder. Terceiro volume de uma autobiografia escrita com vigor literário e rigor intelectual, O jogo dos olhos é também o jogo das vaidades literárias exposto com impiedade, o jogo das descobertas intelectuais narrado com paixão e o confronto decisivo entre mãe e filho traçado com amargo distanciamento), já foram publicados no Brasil, entre outros, seu romance Auto de fé e os relatos As vozes de Marrakech, Festa sob as bombas e Sobre a morte.
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Título original Masse und Macht
"Não há nada que o homem mais tema do que o contato com o desconhecido."
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