Aluísio Azevedo
XIII
.
À proporção que alguns locatários abandonavam a estalagem, muitos pretendentes surgiam
disputando os cômodos desalugados. Delporto e Pompeo foram varridos pela febre amarela e três
outros italianos estiveram em risco de vida. O número dos hóspedes crescia, os casulos subdividiam-se em cubículos do tamanho de sepulturas, e as mulheres iam despejando crianças com uma
regularidade de gado procriador. Uma família, composta de mãe viúva e cinco filhas solteiras, das
quais destas a mais velha tinha trinta anos e a mais moça quinze, veio ocupar a casa que Dona Isabel
esvaziou poucos dias depois do casamento de Pombinha.
Agora, na mesma rua, germinava outro cortiço ali perto, o “Cabeça-de-Gato”. Figurava como seu
dono um português que também tinha venda, mas o legitimo proprietário era um abastado
conselheiro, homem de gravata lavada, a quem não convinha, por decoro social, aparecer em
semelhante gênero de especulações. E João Romão, estalando de raiva, viu que aquela nova
república da miséria prometia ir adiante e ameaçava fazer-lhe à sua, perigosa concorrência. Pôs-se
logo em campo, disposto à luta, e começou a perseguir o rival por todos os modos, peitando fiscais e
guardas municipais, para que o não deixassem respirar um instante com multas e exigências
vexatórias; enquanto pela sorrelfa plantava no espírito dos seus inquilinos um verdadeiro ódio de
partido, que os incompatibilizava com a gente do “Cabeça-de-Gato”. Aquele que não estivesse
disposto a isso ia direitinho para a rua, “que ali se não admitiam meias medidas a tal respeito! Ah! ou
bem peixe ou bem carne! Nada de embrulho!” É inútil dizer que a parte contrária lançou mão
igualmente de todos os meios para guerrear o inimigo, não tardando que entre os moradores da duas
estalagens rebentasse uma tremenda rivalidade, dia a dia agravada por pequenas brigas e rezingas,
em que as lavadeiras se destacavam sempre com questões de freguesia de roupa. No fim de pouco
tempo os dois partidos estavam já perfeitamente determinados; os habitantes do “Cabeça-de-Gato”
tomaram por alcunha o titulo do seu cortiço, e os de “São Romão”, tirando o nome do peixe que a
Bertoleza mais vendia à porta da taverna, foram batizados por “Carapicus”. Quem se desse com um
Carapicus não podia entreter a mais ligeira amizade com um cabeça-de-gato; mudar-se alguém de
uma estalagem para outra era renegar ideias e princípios e ficava apontado a dedo; denunciar a um
contrário o que se passava, fosse o que fosse, dentro do circulo oposto, era cometer traição tamanha,
que os companheiros a puniam a pau. Um vendedor de peixe, que caiu na asneira de falar a um
cabeça-de-gato a respeito de uma briga entre a Machona e sua filha, a das Dores, foi encontrado
quase morto perto do cemitério de São João Batista. Alexandre, esse então não cochilava com os
adversários: nas suas partes policiais figurava sempre o nome de um deles pelo menos, mas entre os
próprios polícias havia adeptos de um e de outro partido; o urbano que entrava na venda do João
Romão tinha escrúpulo de tomar qualquer coisa ao balcão da outra venda. Em meio do pátio do
“Cabeça-de-Gato” arvorara-se uma bandeira amarela; os Carapicus responderam logo levantando um
pavilhão vermelho. E as duas cores olhavam-se no ar como um desafio de guerra.
A batalha era inevitável. Questão de tempo.
Firmo, assim que se instaurara a nova estalagem, abandonou o quarto na oficina e meteu-se lá de
súcia com o Porfiro, apesar da oposição de Rita, que mais depressa o deixaria a ele do que aos seus
velhos camaradas de cortiço. Daí nasceu certa ponta de discórdia entre os dois amantes; as suas
entrevistas tornavam-se agora mais raras e mais difíceis. A baiana, por coisa alguma desta vida, poria
os pés no “Cabeça-de-Gato” e o Firmo achava-se, como nunca, incompatibilizado com os Carapicus.
Para estarem juntos tinham encontros misteriosos num calojio de uma velha miserável da Rua de
São João Batista, que lhe cedia a casa mediante esmolas. O capoeira fazia questão de ficar no
“Cabeça-de-Gato”, porque ai se sentia resguardado contra qualquer perseguição que o seu delito
motivasse; de resto, Jerônimo não estava morto e, uma vez bem curado, podia vir sobre ele com
gana. No “Cabeça-de-Gato”, o Firmo conquistara rápidas simpatias e constituíra-se chefe de malta.
Era querido e venerado; os companheiros tinham entusiasmo pela sua destreza e pela sua coragem;
sabiam-lhe de cor a legenda rica de façanhas e vitórias. O Porfiro secundava-o sem lhe disputar a
primazia, e estes dois, só por si, impunham respeito aos Carapicus, entre os quais, não obstante,
havia muito boa gente para o que desse e viesse.
Mas ao cabo de três meses, João Romão, notando que os seus interesses nada sofriam com a
existência da nova estalagem e, até pelo contrário, lucravam com o progressivo movimento de povo
que se ia fazendo no bairro, retornou à sua primitiva preocupação com o Miranda, única rivalidade
que verdadeiramente o estimulava.
Desde que o vizinho surgiu com o baronato, o vendeiro transformava-se por dentro e por fora a
causar pasmo. Mandou fazer boas roupas e aos domingos refestelava-se de casaco branco e de meias,
assentado defronte da venda, a ler jornais. Depois deu para sair a passeio, vestido de casimira,
calçado e de gravata. Deixou de tosquiar o cabelo à escovinha; pôs a barba abaixo, conservando
apenas o bigode, que ele agora tratava com brilhantina todas as vezes que ia ao barbeiro. Já não era o
mesmo lambuzão! E não parou aí: fez-se sócio de um clube de dança e, duas noites por semana, ia
aprender a dançar; começou a usar relógio e cadeia de ouro; correu uma limpeza no seu quarto de
dormir, mandou soalhá-lo, forrou-o e pintou-o; comprou alguns móveis em segunda mão; arranjou
um chuveiro ao lado da retrete; principiou a comer com guardanapo e a ter toalha e copos sobre a
mesa; entrou a tomar vinho, não do ordinário que vendia aos trabalhadores, mas de um especial que
guardava para seu gasto. Nos dias de folga atirava-se para o Passeio Público depois do jantar ou ia ao
teatro São Pedro de Alcântara assistir aos espetáculos da tarde; do “Jornal do Comércio”, que era o
único que ele assinava havia já três anos e tanto, passou a receber mais dois outros e a tomar
fascículos de romances franceses traduzidos, que o ambicioso lia de cabo a rabo, com uma paciência
de santo, na doce convicção de que se instruía.
Admitiu mais três caixeiros; já não se prestava muito a servir pessoalmente à negralhada da
vizinhança, agora até mal chegava ao balcão. E em breve o seu tipo começou a ser visto com
frequência na Rua Direita, na praça do comércio e nos bancos, o chapéu alto derreado para a nuca e o
guarda-chuva debaixo do braço. Principiava a meter-se em altas especulações, aceitava ações de
companhias de títulos ingleses e só emprestava dinheiro com garantias de boas hipotecas.
O Miranda tratava-o já de outro modo, tirava-lhe o chapéu, parava risonho para lhe falar quando se
encontravam na rua, e às vezes trocava com ele dois dedos de palestra à porta da venda. Acabou por
oferecer-lhe a casa e convidá-lo para o dia de anos da mulher, que era daí a pouco tempo. João
Romão agradeceu o obséquio, desfazendo-se em demonstrações de reconhecimento, mas não foi lá.
Bertoleza é que continuava na cepa torta, sempre a mesma crioula suja, sempre atrapalhada de
serviço, sem domingo nem dia santo; essa, em nada, em nada absolutamente, participava das novas
regalias do amigo; pelo contrário, à medida que ele galgava posição social, a desgraçada fazia-se
mais e mais escrava e rasteira. João Romão subia e ela ficava cá embaixo, abandonada como uma
cavalgadura de que já não precisamos para continuar a viagem. Começou a cair em tristeza.
O velho Botelho chegava-se também para o vendeiro, e ainda mais do que o próprio Miranda. O
parasita não saia agora depois do almoço para a sua prosa na charutaria, nem voltava à tarde para o
jantar, sem deter-se um instante à porta do vizinho ou, pelo menos, sem lhe gritar lá de dentro:
“Então, seu João, isso vai ou não vai?...” E tinha sempre uma frase amigável para lhe atirar cá de
fora. Em geral o taverneiro acudia a apertar-lhe a mão, de cara alegre, e propunha-lhe que bebesse
alguma coisa.
Sim, João Romão já convidava para beber alguma coisa. Mas não era à toa que o fazia, que aquele
mesmo não metia prego sem estopa! Tanto assim que uma vez, em que os dois saíram à tardinha para
dar um giro até à praia, Botelho, depois de falar com o costumado entusiasmo do seu belo amigo
Barão e da virtuosíssima família deste, acrescentou com o olhar fito:
- Aquela pequena é que lhe estava a calhar, seu João!...
- Como? Que pequena?
- Ora morda aqui! Pensa que já não dei pelo namoro?... Maganão! - o vendeiro quis negar, mas o
outro atalhou:
- É um bom partido, é! Excelente menina... tem um gênio de pomba... uma educação de princesa: até
o francês sabe! Toca piano como você tem ouvido... canta o seu bocado... aprendeu desenho... muito
boa mão de agulha!... e...
Abaixou a voz e segredou grosso no ouvido do interlocutor:
- Ali, tudo aquilo é sólido!... Prédios e ações do banco!...
- Você tem certeza disso? Já viu?
- Já! Palavra d’honra!
Calaram-se um instante.
Botelho continuou depois:
- O Miranda é bom homem, coitado! tem lá as suas fumaças de grandeza, mas não o podemos
criminar... são coisas pegadas da mulher; no entanto acho-o com boas disposições a seu respeito... e,
se você souber levá-lo, apanha-lhe a filha...
- Ela talvez não queira...
- Qual o quê! Pois uma menina daquelas, criada a obedecer aos pais, sabe lá o que é não querer?
Tenha você uma pessoa, de intimidade com a família; que de dentro empurre o negócio e verá se
consegue ou não! Eu, por exemplo!
- Ah! se você se metesse nisso, que dúvida! Dizem que o Miranda só faz o que você quer...
- Dizem com razão.
- E você está resolvido a... ?
- A protegê-lo?... Sim, decerto: neste mundo estamos nós para servir uns aos outros!... apenas, como
não sou rico...
- Ah! Isso é dos livros! Arranje-me você o negócio e não se arrependerá...
- Conforme, conforme...
- Creio que não me supõe um velhaco!...
- Pelo amor de Deus! Sou incapaz de semelhante sacrilégio!
- Então!...
- Sim, sim... em todo o caso falaremos depois, com mais vagar... Não é sangria desatada!
E desde então, com efeito, sempre que os dois se pilhavam a sós discutiam o seu plano de ataque à
filha do Miranda. Botelho queria vinte contos de réis, e com papel passado a prazo de casamento; o
outro oferecia dez.
- Bom! então não temos nada feito... resumiu o velho. Trate você do negócio só por si; mas já lhe
vou prevenindo de que não conte comigo absolutamente... Compreende?
- Quer dizer que me fará guerra...
- Valha-me Deus, criatura! não faço guerra a ninguém! guerra está você a fazer-me, que não me quer
deixar comer uma migalha da bela fatia que lhe vou meter no papo!... O Miranda hoje tem para mais
de mil contos de réis! Agora, fique sabendo que a coisa não é assim também tão fácil, como lhe
parece talvez...
- Paciência!
- O Barão há de sonhar com um genro de certa ordem!... Ai algum deputado... algum homem que
faça figura na política aqui da terra!
- Não! melhor seria um príncipe!...
- E mesmo a pequena tem um doutorzinho de boa família, que lhe ronda muito a porta... E ela, ao
que parece, não lhe faz má cara...
- Ah! nesse caso é deixá-los lá arranjar a vida!
- É melhor, é! Creio até que com ele será mais fácil qualquer transação...
- Então não falemos mais nisso! Está acabado!
- Pois não falemos!
Mas no dia seguinte voltaram à questão:
- Homem! disse o vendeiro; para decidir, dou-lhe quinze!
- Vinte!
- Vinte, não!
- Por menos não me serve!
- E eu vinte não dou!
- Nem ninguém o obriga... Adeuzinho!
- Até mais ver.
Quando se encontraram de novo, João Romão riu-se para o outro, sem dizer palavra. O Botelho, em
resposta, fez um gesto de quem não quer intrometer-se com o que não é da sua conta.
- Você é o diabo!... faceteou aquele, dando-lhe no ombro uma palmada amigável. Então não há meio
de chegarmos a um acordo?...
- Vinte!
- E, caso esteja eu pelos vinte, posso contar que...?
- Caso o meu nobre amigo se decida pelos vinte, receberá do Barão um chamado para lá ir jantar ao
primeiro domingo; aceita o convite, vai, e encontrará o terreno preparado.
- Pois seja lá como você quer! mais vale um gosto do que quatro vinténs!
O Botelho não faltou ao prometido: dias depois do contrato selado e assinado, João Romão recebeu
uma carta do vizinho, solicitando-lhe a fineza de ir jantar com ele mais a família.
Ah! que revolução não se feriu no espírito do vendeiro! passou dias a estudar aquela visita; ensaiou o
que tinha que dizer, conversando sozinho defronte do espelho do seu lavatório; afinal, no dia
marcado, banhou-se em varias águas, areou os dentes até fazê-los bem limpos, perfumou-se todo dos
pés à cabeça, escanhoou-se com esmero, aparou e bruniu as unhas, vestiu-se de roupa nova em folha,
e às quatro e meia da tarde apresentou-se, risonho e cheio de timidez, no espelhado e pretensioso
salão de Sua Excelência.
Aos primeiros passos que dera sobre o tapete, onde seus grandes pés, afeitos por toda vida à
independência do chinelo e do tamanco, se destacavam como um par de tartarugas, sentiu logo o
suor dos grandes apuros inundar-lhe o corpo e correr-lhe em bagada pela fronte e pelo pescoço, nem
que se o desgraçado acabasse de vencer naquele instante uma légua de carreira ao sol. As suas mãos
vermelhas e redondas gotejavam, e ele não sabia o que fazer delas, depois que o Barão, muito
solicito, lhe tomou o chapéu e o guarda-chuva.
Arrependia-se já de ter lá ido.
- Fique a gosto, homem! bradou-lhe o dono da casa. Se tem calor venha antes aqui para a janela. Não
faça cerimônia! Ó Leonor! traz o vermute! Ou o amigo prefere tomar um copinho de cerveja?
João Romão aceitava tudo, com sorrisos de acanhamento, sem animo de arriscar palavra. A cerveja
fê-lo suar ainda mais e, quando apareceram na sala Dona Estela e a filha, o pobre-diabo chegava a
causar dó de tão atrapalhado que se via. Por duas vezes escorregou, e numa delas foi apoiar-se a uma
cadeira que tinha rodízios; a cadeira afastou-se e ele quase vai ao chão.
Zulmira riu-se, mas disfarçou logo a sua hilaridade pondo-se a conversar com a mãe em voz baixa.
Agora, refeita nos seus dezessete anos, não parecia tão anêmica e deslavada; vieram-lhe os seios e
engrossara-lhe o quadril. Estava melhor assim. Dona Estela, coitada! é que se precipitava, a passos
de granadeiro, para a velhice, a despeito da resistência com que se rendia; tinha já dois dentes
postiços, pintava o cabelo, e dos cantos da boca duas rugas serpenteavam-lhe pelo queixo abaixo,
desfazendo-lhe a primitiva graça maliciosa dos lábios; ainda assim, porém, conservava o pescoço
branco, liso e grosso, e os seus braços não desmereciam dos antigos créditos.
À mesa, a visita comeu tão pouco e tão pouco bebeu, que os donos da casa a censuraram
jovialmente, fingindo aceitar o fato como prova segura de que o jantar não prestava; o obsequiado
pedia por amor de Deus que não acreditassem em tal e jurava sob palavra de honra que se sentia
satisfeito e que nunca outra comida lhe soubera tão bem. Botelho lá estava, ao lado de um velhote
fazendeiro, que por essa ocasião hospedava-se com o Miranda. Henrique, aprovado no seu primeiro
ano de Medicina, fora visitar a família; em Minas. Isaura e Leonor serviam aos comensais, rindo
ambas à socapa por verem ali o João da venda engravatado e com piegas de visita.
Depois do jantar apareceu uma família; conhecida, trazendo um rancho de moças; vieram também
alguns rapazes; formaram-se jogos de prendas, e João Romão, pela primeira vez em sua vida, viu-se
metido em tais funduras. Não se saiu mal todavia.
O chá das dez e meia correu sem novidade; e, quando enfim o neófito se pilhou na rua, respirou com
independência, remexendo o pescoço dentro do colarinho engomado e soprando com alívio. Uma
alegria de vitória transbordava-lhe do coração e fazia-o feliz nesse momento. Bebeu o ar fresco da
noite com uma volúpia nova para ele e, muito satisfeito consigo mesmo, entrou em casa e recolheuse, rejubilando com a ideia de que ia descalçar aquelas botas, desfazer-se de toda aquela roupa e
atirar-se à cama, para pensar mais à vontade no seu futuro, cujos horizontes se rasgavam agora
iluminados de esperança.
Mas a bolha do seu desvanecimento engelhou logo à vista de Bertoleza que, estendida na cama,
roncava, de papo para o ar, com a boca aberta, a camisa soerguida sobre o ventre, deixando ver o
negrume das pernas gordas e lustrosas.
E tinha de estirar-se ali, ao lado daquela preta fedorenta a cozinha e bodum de peixe! Pois, tão
cheiroso e radiante como se sentia, havia de pôr a cabeça naquele mesmo travesseiro sujo em que se
enterrava a hedionda carapinha da crioula?...
- Ai! ai! gemeu o vendeiro, resignando-se.
E despiu-se.
Uma vez deitado, sem animo de afastar-se da beira da cama, para não se encostar com a amiga,
surgiu-lhe nítida ao espírito a compreensão do estorvo que o diabo daquela negra seria para o seu
casamento.
E ele que até aí não pensara nisso!... Ora o demo!
Não pôde dormir; pôs-se a malucar:
Ainda bem que não tinham filhos! Abençoadas drogas que a Bruxa dera à Bertoleza nas duas vezes
em que esta se sentiu grávida! Mas, afinal, de que modo se veria livre daquele trambolho? E não se
ter lembrado disso há mais tempo!... parecia incrível!
João Romão, com efeito, tão ligado vivera com a crioula e tanto se habituara a vê-la ao seu lado, que
nos seus devaneios de ambição pensou em tudo, menos nela.
E agora?
E malucou no caso até às duas da madrugada, sem achar furo. Só no dia seguinte, a contemplá-la de
cócoras à porta da venda, abrindo e destripando peixe, foi que, por associação de idéias, lhe acudiu
esta hipótese:
- E se ela morresse?...
Continua página 79...
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Leia também:
O Cortiço - XIII: À proporção que alguns locatários abandonavam
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Aluísio Azevedo (Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo), caricaturista, jornalista, romancista e diplomata, nasceu em São Luís, MA, em 14 de abril de 1857, e faleceu em Buenos Aires, Argentina, em 21 de janeiro de 1913.
Era filho do vice-cônsul português David Gonçalves de Azevedo e de D. Emília Amália Pinto de Magalhães e irmão mais moço do comediógrafo Artur Azevedo. Sua mãe havia casado, aos 17 anos, com um comerciante português. O temperamento brutal do marido determinou o fim do casamento. Emília refugiou-se em casa de amigos, até conhecer o vice-cônsul de Portugal, o jovem viúvo David. Os dois passaram a viver juntos, sem contraírem segundas núpcias, o que à época foi considerado um escândalo na sociedade maranhense.
Da infância à adolescência, Aluísio estudou em São Luís e trabalhou como caixeiro e guarda-livros. Desde cedo revelou grande interesse pelo desenho e pela pintura, o que certamente o auxiliou na aquisição da técnica que empregará mais tarde ao caracterizar os personagens de seus romances. Em 1876, embarcou para o Rio de Janeiro, onde já se encontrava o irmão mais velho, Artur. Matriculou-se na Imperial Academia de Belas Artes, hoje Escola Nacional de Belas Artes. Para manter-se fazia caricaturas para os jornais da época, como O Fígaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada. A partir desses “bonecos”, que conservava sobre a mesa de trabalho, escrevia cenas de romances.
A morte do pai, em 1878, obrigou-o a voltar a São Luís, para tomar conta da família. Ali começou a carreira de escritor, com a publicação, em 1879, do romance Uma lágrima de mulher, típico dramalhão romântico. Ajuda a lançar e colabora com o jornal anticlerical O Pensador, que defendia a abolição da escravatura, enquanto os padres mostravam-se contrários a ela. Em 1881, Aluísio lança O mulato, romance que causou escândalo entre a sociedade maranhense pela crua linguagem naturalista e pelo assunto tratado: o preconceito racial. O romance teve grande sucesso, foi bem recebido na Corte como exemplo de Naturalismo, e Aluísio pôde retornar para o Rio de Janeiro, embarcando em 7 de setembro de 1881, decidido a ganhar a vida como escritor.
Quase todos os jornais da época tinham folhetins, e foi num deles que Aluísio passou a publicar seus romances. A princípio, eram obras menores, escritas apenas para garantir a sua sobrevivência. Depois, surgiu nova preocupação no universo de Aluísio: a observação e análise dos agrupamentos humanos, a degradação das casas de pensão e sua exploração pelo imigrante, principalmente o português. Dessa preocupação resultariam duas de suas melhores obras: Casa de pensão (1884) e O cortiço (1890). De 1882 a 1895 escreveu sem interrupção romances, contos e crônicas, além de peças de teatro em colaboração com Artur de Azevedo e Emílio Rouède.
Em 1895 ingressou na diplomacia, momento em que praticamente cessa sua atividade literária. O primeiro posto foi em Vigo, na Espanha. Depois serviu no Japão, na Argentina, na Inglaterra e na Itália. Passara a viver em companhia de D. Pastora Luquez, de nacionalidade argentina, junto com os dois filhos, Pastor e Zulema, por ele adotados. Em 1910, foi nomeado cônsul de 1ª. classe, sendo removido para Assunção. Buenos Aires foi seu último posto. Ali faleceu, aos 56 anos. Foi enterrado naquela cidade. Seis anos depois, por uma iniciativa de Coelho Neto, a urna funerária de Aluísio Azevedo chegou a São Luís, onde o escritor foi sepultado.
Aluísio Azevedo (Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo), caricaturista, jornalista, romancista e diplomata, nasceu em São Luís, MA, em 14 de abril de 1857, e faleceu em Buenos Aires, Argentina, em 21 de janeiro de 1913.
Era filho do vice-cônsul português David Gonçalves de Azevedo e de D. Emília Amália Pinto de Magalhães e irmão mais moço do comediógrafo Artur Azevedo. Sua mãe havia casado, aos 17 anos, com um comerciante português. O temperamento brutal do marido determinou o fim do casamento. Emília refugiou-se em casa de amigos, até conhecer o vice-cônsul de Portugal, o jovem viúvo David. Os dois passaram a viver juntos, sem contraírem segundas núpcias, o que à época foi considerado um escândalo na sociedade maranhense.
Da infância à adolescência, Aluísio estudou em São Luís e trabalhou como caixeiro e guarda-livros. Desde cedo revelou grande interesse pelo desenho e pela pintura, o que certamente o auxiliou na aquisição da técnica que empregará mais tarde ao caracterizar os personagens de seus romances. Em 1876, embarcou para o Rio de Janeiro, onde já se encontrava o irmão mais velho, Artur. Matriculou-se na Imperial Academia de Belas Artes, hoje Escola Nacional de Belas Artes. Para manter-se fazia caricaturas para os jornais da época, como O Fígaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada. A partir desses “bonecos”, que conservava sobre a mesa de trabalho, escrevia cenas de romances.
A morte do pai, em 1878, obrigou-o a voltar a São Luís, para tomar conta da família. Ali começou a carreira de escritor, com a publicação, em 1879, do romance Uma lágrima de mulher, típico dramalhão romântico. Ajuda a lançar e colabora com o jornal anticlerical O Pensador, que defendia a abolição da escravatura, enquanto os padres mostravam-se contrários a ela. Em 1881, Aluísio lança O mulato, romance que causou escândalo entre a sociedade maranhense pela crua linguagem naturalista e pelo assunto tratado: o preconceito racial. O romance teve grande sucesso, foi bem recebido na Corte como exemplo de Naturalismo, e Aluísio pôde retornar para o Rio de Janeiro, embarcando em 7 de setembro de 1881, decidido a ganhar a vida como escritor.
Quase todos os jornais da época tinham folhetins, e foi num deles que Aluísio passou a publicar seus romances. A princípio, eram obras menores, escritas apenas para garantir a sua sobrevivência. Depois, surgiu nova preocupação no universo de Aluísio: a observação e análise dos agrupamentos humanos, a degradação das casas de pensão e sua exploração pelo imigrante, principalmente o português. Dessa preocupação resultariam duas de suas melhores obras: Casa de pensão (1884) e O cortiço (1890). De 1882 a 1895 escreveu sem interrupção romances, contos e crônicas, além de peças de teatro em colaboração com Artur de Azevedo e Emílio Rouède.
Em 1895 ingressou na diplomacia, momento em que praticamente cessa sua atividade literária. O primeiro posto foi em Vigo, na Espanha. Depois serviu no Japão, na Argentina, na Inglaterra e na Itália. Passara a viver em companhia de D. Pastora Luquez, de nacionalidade argentina, junto com os dois filhos, Pastor e Zulema, por ele adotados. Em 1910, foi nomeado cônsul de 1ª. classe, sendo removido para Assunção. Buenos Aires foi seu último posto. Ali faleceu, aos 56 anos. Foi enterrado naquela cidade. Seis anos depois, por uma iniciativa de Coelho Neto, a urna funerária de Aluísio Azevedo chegou a São Luís, onde o escritor foi sepultado.
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